segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017
NOSSAS FORÇAS ARMADAS SÃO COMO UM LEÃO SEM JUBA
A proclamação da independência do Brasil gerou uma guerra entre as forças imperiais e as forças leais a Portugal, o período da regência enfrentou uma série de guerras civis por dez anos no Brasil, de Norte a Sul.
Tivemos um guerra em nossas fronteiras durante o ápice do Poder do 2º Reinado Imperial. A proclamação da República gerou conflitos internos até o estabelecimento do Estado Novo, este teve que lutar contra as intentonas integralista e comunista e na sequência participamos da segunda guerra mundial...
Então foi dado o contragolpe de 1964, e o máximo que nossos soldados e Generais tiveram que fazer foi esmagar um grupo irrelevante do ponto de vista militar, e, desde então, as forças armadas envelheceram e se acomodaram na paz e quietude do serviço público e perderam o verniz que se adquire na experiência de combate oriunda dos grandes conflitos, apequenaram-se na rotina da repartição em que se tornou o quartel, sujeitando-se à perda fisiológica de testosterona típica do leão derrotado, sem juba, sem harém, sem força, sem vontade de lutar.
Nosso exército democrático parece aquele descrito por Tocqueville, uma coleção de velhos decrépitos e temerosos, acomodados em suas patentes que tantos anos e esforços custaram na mansidão da paz... mas, nós sabemos qual é o destino de quem é muito manso...
Werner Nabiça Coêlho - 30.01.2017
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REFLEXÕES SOBRE A TEORIA MIMÉTICA DE RENÉ GIRARD
O ponto que me proponho a discutir é justamente o conceito de racionalidade precipitado pelo cartesianismo, pois o fato de existir uma razão matematizante não exclui que o fenômeno da racionalidade inclua outras manifestações racionais.
Vou exemplificar com minha curiosidade relativa ao problema da origem da linguagem, pois não existe qualquer forma de o método cartesiano explicar o fenômeno da linguagem em sua gênese, há necessidade de se definir a linguagem pré-verbal e sua evolução para a linguagem verbal.
Neste sentido há que se considerar que há a uma linguagem não-verbal atuando antes, durante e depois, e que tal linguagem não é mensurável de forma quantitativa, mas é um qualidade da comunicação ser mais ou menos intensa, e esta intensidade no nível linguístico não verbal é o fenômeno emocional, que não é mensurável numericamente, e antes de existir a linguagem falada houve a linguagem emocional.
O complexo processo de manifestação da interação social por meio das emoções que possibilitou através do mecanismo mimético o desencadeamento do fenômeno sócio-religioso do bode expiatório, e com o sacrifício primordial que ocorreu diversas vezes em diversas culturas que se obteve a condição de possibilidade para a criação da própria razão que se utiliza da linguagem como ferramenta de comunicação.
A repetição de ritos sacrificiais consolida paulatinamente a própria linguagem verbal, criam-se os mitos originadores das primeiras expressões verbais.
E assim justifico minha percepção de que a razão que mensura dentro do corte metodológico da razão matemática não é suficiente para explicar o próprio fenômeno da razão mesma.
Werner Nabiça Coêlho - 10/06/2016
O fato de não existirem livros religiosos em algum tempo pretérito não implica na inexistência de religião, pois esta existe desde sempre, ao ser considerado o conceito de tempo de existência do ser humano.
A comunicação não escrita, ou melhor dizendo, a comunicação oral, é uma das fontes primordiais do conhecimento religioso, mas não é o seu pressuposto, a própria fala foi criada e conformada pela religião.
O marco teórico presente na teoria mimética, desenvolvida por René Girard é um adequado referencial explicativo para o fenômeno religioso, e, por tabela, serve para descrever a própria constituição da linguagem humana que necessitou transitar da fase pré-verbal para a expressão verbal.
Os dados que se originam da pesquisa mimética demonstram que foi a Religião que criou o homem, pois foi com o ritual religioso que se constituiu a própria fala.
Somente existiu a possibilidade do nascimento da cultura porque houve uma "evolução" da própria linguagem, em razão do fenômeno religioso primordial, resultado da "crise mimética", descrita pela antropologia girardiana.
Ocorre que as religiões arcaicas são essencialmente vitimárias e sacrificiais, e, neste ponto está a origem do conceito de pecado original, pois a sociedade foi erigida sobre uma montanha de vítimas sacrificadas.
A revelação cristã demonstrou que não podemos prosseguir nesse processo de sacrificar o próximo, pois revelou-se que a vítima é inocente, e Cristo é por isso a vítima perfeita, que causa a destruição das religiões arcaicas e seus mitos, pois os mitos mentem ao atribuir a culpa à vítima, e o Deus vivo revela que é mais sagrado poupar a vítima inocente, do que realizar o culto da violência.
Werner Nabiça Coêlho - 24/06/2016
O modelo mimético pode ser aplicado à chamada "síndrome de Estocolmo", considerando-se que esta é uma clara hipótese prática em que se manifesta uma das possíveis manifestações da relação entre a violência e o sagrado, em que se sacraliza a violência e a mesma transforma-se na linguagem dos mitos e em práticas rituais que podemos chamar de síndromes, ou outros apelidos modernos.
Assim se estabelece um tipo de culto ao deus violento, que deve ser ritualisticamente homenageado, amado e temido, com fundamento na crise mimética desencadeada pela ação violenta do algoz.
Em suma, o instinto de sobrevivência procura razões para justificar a violência e racionalizar a submissão, como algo positivo, mesmo que injusto de fato e de direito.
Werner Nabiça Coêlho - 24/06/2016
René Girard converteu-se ao catolicismo quando constatou que a condição cultural que possibilitou a superação da violência mimética, que é o fundamento das religiões anteriores à boa nova cristã.
Foi justamente a paixão de Cristo que descortinou a falsidade dos mitos das religiões de até então, e revelou todo o mecanismo mimético, e essa revelação é considerada pelo Girard um verdadeiro milagre que não pode ser justificado pelos dados culturais somente, houve, sim, uma revelação, ou como diria o Wolfgang Smith houve uma causalidade vertical
Werner Nabiça Coêlho - 21/10/2016
O René Girard tem uma abordagem interessante sobre a origem das interdições sociais, e numa rápida síntese posso descrever que ele define que é necessário para a saúde da mente humana, e da sociedade em geral, que haja diferenciações e hierarquias, estruturas sociais que se consolidam mediante sucessivas crises miméticas.
São crises oriundas de situações na qual o risco da violência autodestruidora foram superadas, e uma dessas hipóteses é o sexo se tornar um evento intestino às relações familiares, essa hierarquia é tão severamente representada na mitologia grega, por exemplo, que Tróia precisou ser aniquilada para ser preservada a instituição do casamento, que dizer do incesto.
Werner Nabiça Coêlho - 20/11/2016
O que torna a hipótese mimética interessante é que a origem das interdições é necessariamente um processo antropológico, em seu sentido mais originário, é como que o processo de formação geológica que conforma os montes e vales da psique humana, das formas mais diversificadas possíveis mas sempre remetendo aos mesmos paradigmas que fornecem o esteio e os princípios para a hierarquia social, e, inclusive, pode ser que o incesto, de um ponto de vista ritual seja permitido, mas, somente para a classe de pessoas que serão possíveis bodes expiatórios, como o que ocorre com os Faraós.
Werner Nabiça Coêlho - 20/11/2016
As razões para a existência da crise mimética são um pouco mais profundas que a existência de um suposto conflito de um contra todos.
É como se fosse um processo, que quando dá certo cria uma válvula de escape para a violência social acumulada pelo processo de mediação interna, quando dá errado a comunidade entra em um processo de autodestruição mediante vinganças intermináveis.
A noção de horda é uma forma que a linguagem ordinária consegue descrever a própria crise mimética, como uma crise de indiferenciação, onde ninguém pode ser de ninguém e todos estão contra todos.
A solução da crise cria modelos de comportamento, que por sua vez são a origem das relações sociais que possibilitam a vida comunitária.
A teoria mimética demonstra que a solução de crises sociais nos primórdios da humanidade decorreu de inúmeros processos de criação de bodes expiatórios, que ora davam errado, e a sociedade desaparecia em meio ao caos social, ora davam certo, mediante o sacrifício de bodes expiatórios, e, assim, instituíam-se ritos e criavam-se mitos.
As vítimas eram normalmente elementos da sociedade que padeciam de algum defeito ou debilidade, ou mesmo uma característica de exceção, como ser um estrangeiro, que serviam de elementos catárticos para expulsar a violência profana, mediante a criação de uma violência sagrada, que passaria a ser ritualmente repetida, e, através de infindáveis repetições, assim, a própria cultura humana foi sedimentando-se.
Werner Nabiça Coêlho - 20/11/2016
Sem adentrar no modelo econômico de estrutura social, adoto o modelo antropológico de descrição da sociedade como o resultado de interação mimética.
A gênese da cultura é fundamentalmente uma criação de hierarquias sociais fundadas na violência sagrada, que evolui paulatinamente para conformações mais brandas na qual a solução sacrificial migra para estruturas mais sofisticados.
Segundo tal modelo inexiste sociedade sem hierarquia, e sem padrões fundados em modelos miméticos, que suplantam a mediação interna pela criação de mediações externas.
Neste modelo antropológico o anarco-capitalismo é uma impossibilidade ontológica, em razão de estabelecer um pressuposto que impõe a destruição das hierarquias.
O modelo cristão é o mais impressionante padrão de supressão da violência, pois supera a crise mimética com o estabelecimento da racionalidade objetiva que distingue claramente o sacrificador e o sacrificado, e, portanto, é o portador dos padrões éticos que possibilitam a existência de uma sociedade capitalista bem regulada.
O anarco-capitalismo é uma proposta de (des)organização social inviável pois desencadeia a crise mimética.
Em síntese, a economia e sua prosperidade estão condicionados pela existência prévia de soluções de pacificação social, para permitir uma ordem legal e social capaz de proteger as trocas voluntárias, bem como impedir trocas involuntárias.
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sábado, 25 de fevereiro de 2017
A EUGENIA ONTEM E HOJE
Sir Francis Galton (1822-1911) |
Bioética é um ramo da ética, e a ética por sua vez é um galho que emerge da grande árvore da reflexão filosófica, esta é uma planta cuja origem está no afeto do ser humano ao bem, e ao natural sentimento de dúvida e admiração que resulta do conhecimento da própria ignorância, e da necessidade de suprir tal carência.
Aristóteles ao tratar da definição de filosofia descreve que seu objeto é "especular sobre os princípios e as causas, pois o bem e o fim das coisas é uma causa"(1), e constata:
De fato, os homens começaram a filosofar, agora como na origem, por causa da admiração, na medida em que, inicialmente, ficavam perplexos diante das dificuldades mais simples; em seguida progredindo pouco a pouco, chegaram a enfrentar problemas sempre maiores [...]. Ora, quem experimenta uma sensação de dúvida e de admiração reconhece que não sabe; e é por isso que também aquele que ama o mito é, de certo modo, filósofo: o mito com efeito, é constituído por um conjunto de coisas admiráveis. De modo que, se os homens filosofaram para libertar-se da ignorância, é evidente que buscavam o conhecimento unicamente em vista do saber e não por alguma utilidade prática. (2)
Na perspectiva aristotélica, podemos afirmar que a ética, também, origina-se na reflexão sobre a conduta humana, que tanto nos deixa espantados, admirados e perplexos.
Alguns posicionamentos bioéticos espantosos sobre a eugenia estão em debate no países do Atlântico Norte, lembrando que eugenia significa "bem-nascido".
Com base na obra "Contra a perfeição" de Michael J. Sandel, relata que Francis Galton, primo de Charles Darwin, em 1883, aplicou métodos estatísticos ao estudo da hereditariedade, e, com base nisso, defendeu uma nova filosofia naturalista da ciência:
O que a natureza faz às cegas, devagar e de modo grosseiro, os homens podem fazer de modo providente, rápido e gentil (...). O aprimoramento de nossa raça me parece ser um dos mais elevados objetivos que podemos buscar racionalmente (5)
Em 1910 Charles B. Davenport abriu o Eugenic Records Office em Cold Spring Harbor, Long Island, para desenvolver pesquisas no sentido de evitar a reprodução dos geneticamente desqualificados.
Margaret Sanger, pioneira do feminismo e do controle de natalidade defendia a eugenia, para que "Mais crianças dos qualificados, menos dos desqualificados – essa é a principal questão do controle de natalidade" (6)
Margaret Sanger, pioneira do feminismo e do controle de natalidade defendia a eugenia, para que "Mais crianças dos qualificados, menos dos desqualificados – essa é a principal questão do controle de natalidade" (6)
Nos anos 1920 cursos de eugenia eram ministrados em 350 faculdades e universidades dos Estados Unidos, para alertar os jovens americanos para o seu dever reprodutor.
Em 1907 o Estado de Indiana adotou a primeira lei de esterilização compulsória para pacientes mentais, prisioneiros e miseráveis, e que 29 Estados americanos acabaram adotando leis de esterilização compulsória "e mais de 60 mil americanos geneticamente ‘defeituosos’ foram esterilizados” (7).
Em 1933 Hitler promulgou uma ampla lei de esterilização que arrancou elogios dos eugenistas americanos, mas ao fim da Segunda Guerra Mundial, as atrocidades cometidas provocaram o recuo do movimento eugenista norte-americano.
Atualmente, vieram à tona diversos dilemas relativos à engenharia genética e clonagem humana, e, assim criou-se um debate em que:
Os críticos da engenharia genética argumentam que a clonagem humana, o melhoramento genético e a busca por crianças feitas sob encomenda não passam de eugenia ‘privatizada’ ou de ‘livre mercado’. Já os defensores retrucam que as escolhas genéticas feitas livremente não são eugenia, pelo menos não no sentido pejorativo do termo. Retirar o aspecto da coerção, argumentam, é retirar aquilo que torna a eugenia repugnante. (8)
O filósofo do direito Ronald Dworkin também defende uma versão liberal da eugenia. Não há nada de errado na ambição ‘de tornar a vida das futuras gerações de seres humanos mais longa e repleta de talentos e, portanto, de conquistas’, escreve Dworkin. ‘Pelo contrário, se brincar de Deus significa lutar para melhorar a nossa espécie, e trazer para nosso projeto consciente a resolução de melhorar o que Deus deliberadamente ou a natureza cegamente fizeram evoluir ao longo de éons, então o primeiro princípio do individualismo ético comanda essa luta’[...] (9)
Intervir geneticamente para selecionar ou melhorar as crianças é censurável, argumenta Habermas, porque viola os princípios liberais de autonomia e igualdade. Viola a autonomia porque os indivíduos geneticamente programados não podem encarar a si mesmos como os ‘únicos autores de sua própria história de vida’ e prejudica a igualdade na medida em que destrói ‘as relações essencialmente simétricas entre seres humanos livres e iguais’ ao longo das gerações. (10)
[...] a eugenia perpetrada pelos pais é censurável porque expressa e estabelece certa atitude diante do mundo – uma atitude de dominação, que não valoriza o caráter de dádiva das potências e conquistas humanas e desconsidera aquela parcela da liberdade que consiste em uma persistente negociação com aquilo que nos é dado. (11)
Num mundo social que preza o domínio e o controle, a experiência de ser pai ou mãe é uma escola de humildade. O fato de nos importarmos profundamente com nossos filhos mas não podermos escolher o tipo de filhos que queremos ensina os pais a se abrirem ao imprevisto. (12)
Os maiores riscos são de dois tipos. Um deles envolve o destino dos bens humanos encarnados em importantes práticas sociais – os preceitos do amor incondicional e abertura ao imprevisto, no caso da experiência parental; a celebração dos talentos e dos dons naturais nas artes e nos esportes; a humildade diante do privilégio próprio e a disposição de partilhar os frutos da sua boa fortuna por meio de mecanismos de solidariedade social. O outro diz respeito a nossa orientação em relação ao mundo que habitamos e ao tipo de liberdade ao qual aspiramos (13)[...] é possível ver a engenharia genética como a expressão máxima de nossa decisão de subjugar o mundo, como mestres de nossa própria natureza. Essa visão da liberdade, entretanto, é falha. Ela ameaça banir a valorização da vida como dádiva e nos deixar sem nada para defender ou contemplar além da nossa própria vontade. (14)
Os fundamentos da eugenia, que resultam do molde teórico darwinista, exigem o sacrifício dos menos aptos no altar da religião da razão científica, que possui a fé no naturalismo materialista e nihilista.
Se, no teatro de nossos pensamentos, buscarmos base de conduta moral, em teorias que se definem na necessidade de preservação dos mais aptos, naturalmente, seremos encaminhados, por tais raciocínios supostamente científicos, a sermos defensores da eugenia.
A eugenia é um método de eliminação sistemática dos menos aptos, com base numa metodologia científica de ideologia darwinista, não importa se tal modelo de conduta moral é oriundo de um Poder de Império Estatal, ou é oriundo de um suposto liberalismo individualista que se justifica em alegadas boas intenções, ambas as posturas possuem fundamento último na "vontade de poder" ao gosto de Nietzsche.
NOTAS:
(1) Aristóteles, Metafísica, 982b 10, Volume II, 5.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2015, p. 11
(2) loc. cit.
(3) SANDEL, Michael J. Contra a perfeição : ética na era da engenharia genética; tradução Ana Carolina Mesquita. – 1.ed. – Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2013, p. 77
(4) op. cit, p. 78
(5) op. cit., p. 79
(6) op. cit., p. 81
(7) op. cit., p. 88
(8) op. cit., p. 91
(9) op. cit., p. 93
(10) op. cit., p. 98
(11) op. cit., p. 107
(12) op. cit., p. 109
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sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017
AFORISMOS E PENSAMENTOS VÁRIOS
Tenho uma certa desconfiança de que a filosofia grega foi mais um
resultado da perda de sentido da religião pagã, em meio ao
desenvolvimento econômico e cultural do
mundo helênico, do que propriamente uma busca meramente intelectual, a
filosofia quando bem operada destina-se a ser uma ferramenta de busca de
sentido, mesmo que seja para negar o próprio sentido como fazia o
Nietzsche, em suma, o amor à sabedoria decorre de uma busca do sentido
inerente ao próprio saber.
***
Liberdade não é uma realidade ontologicamente autônoma, é um direito
vinculado a muitos e variados condicionamentos prévios, por isso que sua
defesa implica em eterna vigilância
***
A verdade é algo que possui uma essência própria, ou é somente o nome
que se dá para uma opinião predominante?
Um consenso coletivamente
partilhado é a fonte da verdade, ou uma
única pessoa pode ser o repositório de toda a verdade, não por ela
possuir à verdade, mas por ser possuída por esta?
Um conjunto de
interesses parciais e organizados pode estabelecer algum nível de
verdade, ou a verdade não está sujeita a nenhuma vontade?
Podemos
considerar que há uma postura mais ou menos conveniente em relação à
verdade, ou esta não admite se objeto da vontade alheia?
Afinal existe
alguma verdade que seja validada somente por conveniências políticas, de
grupos ou de pessoas, ou a verdade somente possui a conveniência de ser
verdadeira para toda a eternidade?
A verdade é um princípio da realidade, ou ela é criada pelas circunstâncias de cada momento?
Só sei que a verdade é verdadeira, porque afirmar que a verdade em
essência, ou em acidente, é uma mentira resulta numa petição de
princípio, numa aporia lógica, isto é, se for válida a negação da
existência da verdade, esta negação será verdadeira.
Como diria o poeta espanhol Antônio Machado (que conheci graças ao Olavo de Carvalho):
y sigue siendo verdad,
aunque se piense al revés"
"La verdad es lo que es
y sigue siendo verdad,
aunque se piense al revés"
***
O AMOR A DEUS É O MODELO DO AMOR FRATERNAL
Uma anotação que deixo a respeito do Diálogo Fedro, é que o amor
definido por Sócrates, em seu mais alto nível, é o amor que se deve
guardar pela contemplação da verdade, do
bem, do justo e do belo no grau da pureza divina, e, que o eventual
amor carnal entre os amantes do saber, é uma forma de apequenar e
dessacralizar o amor ao saber, cuja origem é divinal, que deve ser
cultivado e resguardado entre amigos, em suma, o saber é muito mais
profundo quando associado à castidade, por ser um dever sagrado perante
Deus.
***
A TEORIA MIMÉTICA E O FEDRO DE PLATÃO.
Sócrates discorre a respeito do mito, e de sua natureza questionável do ponto de vista racional, o que dá a entender que naquele
tempo histórico contemporâneo ao nosso filósofo, as verdades religiosas
tradicionais estavam sendo duramente criticadas, vejamos:
"IV - Sócrates - Se, a exemplo dos sábios, eu não acreditasse, não seria de estranhar. Interpretação sutil da lenda fora dizer que o ímpeto de Bóreas a derrubou dos rochedos próximos, quando ela brincava com Farmaceia, e que as próprias circunstâncias de sua morte deram azo a dizerem que Bóreas a havia raptado." (229d) (p. 36)
Ora, este
trecho revela-se perfeito, para análise com a utilização da chave
explicativa de René Girard, pois descreve um mito em que há um bode
expiatório (Oritia), e um deus (Bóreas) que personifica, neste caso, a
multidão, que em sua fúria lança a vítima do rochedo, sem contaminar-se
ritualmente com a violência bruta, pois utiliza-se de meios sagrados de
imolação, e, por outro lado, a própria explicação dos sábios referidos
por Sócrates, são um claro indício de um forte processo de
dessacralização da religião ateniense, submetida à crítica racionalista
que busca razões humanas para o surgimento das lendas.
***
A MITOLOGIA DA ABSOLUTA AUTONOMIA DO EGO
Vivemos uma cultura fundada na mitologia da absoluta autonomia do ego,
que resulta na autodestruição egocêntrica, e, na minha opinião descalça e
nua, o remédio para esse mal está na
busca da verdade religiosa e filosófica, preferencialmente ambas, mas
cada uma destas buscas por si mesmas resultam nas únicas terapias
eficazes, pois são meios de mirar corretamente no alvo do
autoconhecimento que possibilita a autoconsciência, que por fim são os
instrumentos para refinar a percepção objetiva do mundo e de sua beleza e
bondade, com a reconquista da linguagem que possui a capacidade de
comunicar verdades da vida, pois hoje a juventude é um estrangeiro em
sua própria consciência.
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domingo, 5 de fevereiro de 2017
O ANACRONISMO ESSENCIAL DA HISTÓRIA PRESENTE DO BRASIL
Gerontocracia brasileira. |
O anacronismo essencial da história está na permanente diferença de vitalidade, interesses e anseios, que condicionam o convívio entre os jovens, os adultos e os idosos, em outras palavras, a história, entre outros fatores, é movida pelo conflito de gerações no âmbito de um povo.
O Brasil, neste exato momento, vive intesamente esta experiência histórica!
José Ortega y Gasset (1) descreve o dinamismo do acontecer temporal, com base na percepção de que um povo existe em três tempos, presentes e simultâneos, representados por três gerações, que são cronologicamente contemporâneas, mas não são coetâneas, isto é, são compostas por pessoas de gerações diferentes, portadores de energias vitais distintas.
Um povo, segundo esta ótica filosófica, é movido, desde dentro, em sua história, pela diferença de coetaneidade entre gerações, são contemporâneas somente no tempo, mas no modo de viver há três presentes distintos em luta, um cheio de promessas futuras, outro vivendo um presente, que se manifesta na forma de futuro que emerge com urgência, e, por fim, um presente próximo a um futuro que se finda, e, que se aproxima cada vez mais de se tornar um passado consolidado, dada a aproximação da eternidade.
Quem hoje tem entre 35 e 45 anos de idade presenciou, por meio da cobertura da imprensa, desde o início dos anos 1990, uma sucessão contínua de escândalos e desastres políticos e sociais.
Confesso que, com base nesta experiência histórica, desenvolvi por volta dos anos 2010-2013, uma vaga impressão de que a história do Brasil havia estacionado, estagnado, tornado-se estática, com base num aparente triunfo petista sobre todas as instituições pátrias (até os programas humorísticos, e a sátira política haviam perdido a graça, o senso de humor estava anestesiado), e o vocabulário jornalístico já reportava termos políticos perigosos que começavam a entrar no vocabulário corrente por volta de 2013/2014, tais como "Governo Central" e "Constituinte Exclusiva para Reforma Política".
Confesso que, com base nesta experiência histórica, desenvolvi por volta dos anos 2010-2013, uma vaga impressão de que a história do Brasil havia estacionado, estagnado, tornado-se estática, com base num aparente triunfo petista sobre todas as instituições pátrias (até os programas humorísticos, e a sátira política haviam perdido a graça, o senso de humor estava anestesiado), e o vocabulário jornalístico já reportava termos políticos perigosos que começavam a entrar no vocabulário corrente por volta de 2013/2014, tais como "Governo Central" e "Constituinte Exclusiva para Reforma Política".
Há um velho recurso da narrativa histórica, na qual grandes mudanças são precedidas de desastres naturais, e, neste caso, tivemos um período atípico de seca, e a consequente crise hídrica (2), que, em grande parte, foi fruto da imprevidência e corrupção estatal brasileira.
Vieram os protestos de Junho de 2013, e, além dos eventos aleatórios de ordem social e climática, houve, finalmente, a emergência de nosso anacronismo histórico essencial, por meio de uma evidente luta entre gerações, e, entre tantos exemplos de campos de batalhas, o mais destacado de todos foi a Operação Lava Jato.
Vieram os protestos de Junho de 2013, e, além dos eventos aleatórios de ordem social e climática, houve, finalmente, a emergência de nosso anacronismo histórico essencial, por meio de uma evidente luta entre gerações, e, entre tantos exemplos de campos de batalhas, o mais destacado de todos foi a Operação Lava Jato.
Observe-se o exemplo do Juiz Sérgio Fernando Moro, cujo início de carreira judicante ocorreu em 1996 (3), quando ainda poderia ser classificado na geração dos jovens, e, hoje, já pode ser considerado um homem maduro, na faixa dos 40 anos de idade, e, tal como este magistrado, há uma geração de brasileiros, que ocupam postos e funções, públicas e privadas, que vivenciam um conflito de gerações com a gerontocracia, que se encontra encastelada no poder, afinal, é fácil perceber que, as figuras dominantes da política nacional, se encontram na faixa dos 60/70 anos de idade ou mais.
A crise entre gerações é um dado presente, uma luta social entre velhos senhores decrépitos da política nacional de um lado, e, de outro, a geração que atingiu a maturidade necessária para assumir as rédeas do governo, da lei, dos negócios e da história brasileira.
A tensão da luta entre gerações permanecerá um importante fator da nossa história, uma vez que a expectativa de vida da elite anciã (e o Hospital Sírio-Libanês de São Paulo) a habilita a resistir, em seu anacronismo, por muito tempo ainda.
(1) ORTEGA Y GASSET, José. Que é filosofia? : obras inéditas . 1ed.. Rio de Janeiro: Ed. Livro Ibero-Americano Ltda, 1961, p. 27.
(2)http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI216277,101048-A+crise+hidrica+brasileira+e+a+falta+de+planejamento
(3) Currículo Juiz Sergio Fernando Moro: http://lattes.cnpq.br/9501542333009468
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É BOM CITAR: DISTINÇÃO ENTRE COETANEIDADE E CONTEMPORANEIDADE
[...] É isto a geração: uma variedade humana no sentido rigoroso que ao conceito de "variedade" dão os naturalistas. Os membros dela vêem ao mundo dotados de certos caracteres típicos, disposições, preferências que lhes emprestam uma fisionomia comum, diferenciando-os da geração anterior.
Mas esta idéia inocula súbita energia e dramatismo ao fato tão elementar como inexplorado de que em todo presente coexistem três gerações: os jovens, os homens maduros, os velhos.
Porque isto significa que tôda atualidade histórica, todo "hoje" envolve em rigor três tempos diversos, três "hoje" diferentes, ou, em outras palavras, que o presente é rico de três grandes dimensões vitais, as quais convivem alojadas nêle, queiram ou não, travadas umas com as outras e, por fôrça, como são diferentes, em essencial hostilidade.
"Hoje" é para para uns vinte anos, pra outros quarenta, para outros sessenta; e isso, que sendo três modos de vida tão diversos, tenham que ser o mesmo "hoje", declara sobradamente o dinâmico dramatismo, o conflito e a colisão que constitui o fundo da matéria histórica, de tôda convivência atual. [...]
Todos somos contemporâneos, vivemos no mesmo tempo e atmosfera, mas contribuímos para formá-los em tempo diferente.
Só se coincide com os coetâneos. Os contemporâneos não são coetâneos; urge distinguir em história
entre coetaneidade e contemporaneidade.
Alojados num mesmo tempo externo e cronológico convivem três tempos vitais diversos.
É isto o que costumo chamar o anacronismo essencial da história.
Graças a êsse desequilíbrio interior se move, muda, roda, flui.
Se todos os contemporâneos fôssemos coetâneos, a história se deteria anquilosada, putrefacta num gesto definitivo sem possibilidade de inovação fundamental alguma. (p. 26-7)
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SOBRE A EPIDEMIA MUNDIAL DE SUICÍDIOS ENTRE JOVENS
A Organização Mundial da Saúde (OMS) descobriu que o suicídio mata mais jovens que o vírus da SIDA (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), dada esta constatação há uma percepção generalizada de que o mundo é uma bosta, e que os que têm um pouco de massa cinzenta se matam.
Discordo de tal opinião, pois a depressão do suicida tem mais relação
com a perda de sentido da vida, vazio este que resulta do materialismo e
do consumismo como eixos de orientação da vida contemporânea.
A vida não é só a matéria segunda, é sobretudo uma derivação do
elemento espiritual, pois perdeu-se a percepção de que o sobrenatural é
inerente à realidade do natural.
A visão negativa e suicida é uma
boa síntese do pecado original, e da necessidade de redenção, temperada
com um pouco de hedonismo, cuja tentação, se acaso não for vencida,
pode danar a alma, pois se não podemos afirmar que o inferno existe,
também não podemos afirmar que ele não seja real.
Nem sempre o
fracasso é uma culpa exclusiva do suicida, alguns fracassos são
projetados, para que a vítima não consiga encontrar a solução para
enigma de seu sofrimento, neste momento é que o estudo e a reflexão,
aliados à busca do autoconhecimento, ajudam a superar essa artimanha
diabólica da cultura pós-moderna, que criou o argumento politicamente correto, ao arrepio do argumento simplesmente verdadeiro e grávido de sentido.
O Apóstolo Paulo, em sua Primeira Carta aos Coríntios, 14, 10-11, assim se refere quanto ao verdadeiro valor da linguagem
"No mundo existem não sei quantas espécies de linguagem, e não existe nada sem linguagem. Ora, se eu não conheço a força da linguagem, serei como estrangeiro para aquele que fala, e aquele que fala será um estrangeiro para mim"
A força da linguagem não está na polidez mas na eficácia, a linguagem é o
princípio para a ação, boa linguagem implica em ações eficazes, e, uma das fontes da atual epidemia de suicidas está na criação de uma geração (des)educada no politicamente correto, que padece de força de expressão, e, por isso, afunda-se na ineficácia do desespero da depressão.
Vivemos uma cultura fundada na
mitologia da absoluta autonomia do ego, que resulta na autodestruição
egocêntrica, e, na minha opinião descalça e nua, o remédio para esse mal
está na busca da verdade religiosa e filosófica, preferencialmente
ambas, mas cada uma destas buscas por si mesmas resultam nas únicas
terapias eficazes, pois são meios de mirar corretamente no alvo do
autoconhecimento que possibilita a autoconsciência, que por fim são os
instrumentos para refinar a percepção objetiva do mundo e de sua beleza e
bondade, com a reconquista da linguagem que possui a capacidade de comunicar verdades da vida, pois hoje a juventude é um estrangeiro em sua própria consciência.
Werner Nabiça Coêlho - 04.02.2017
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