sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

O POLITICAMENTE CORRETO É A LIBERDADE SOCIALIZADA

Não há inferno. Bosch, parte do Jardim das Delícias

A verdade não é um artigo que se possua como um objeto material, é algo que se revela na forma de uma realidade, cujo conhecimento demonstra algo objetivo, é um obstáculo, é um pedra de tropeço, é um escândalo, e, por mais que o subjetivismo individualista, ou socialista, se rebele perante tal concretude, perdura a verdade como algo luminoso que se evidencia de forma penetrante aos olhos do corpo, do intelecto e do espírito, afinal, a verdade é algo politicamente incorreto, dado que a política é o reino da mentira.

Quando alguém acredita que a verdade é subjetiva, e, portanto, relativa a cada pessoa, acaba por considerar que a verdade é algo que se inventa livremente, ou seja, julga-se que qualquer mentira pode ser considerada uma verdade com fundamento unicamente na vontade individual, daí, quando uma mentira é encampada por um grupo de indivíduos cria-se o argumento de que a mentira... digo, a "verdade" desse grupo deverá ser imposta por ser uma "verdade" considerada necessária pela vontade política de um grupo, assim temos a mentira coletivizada erigida ao estado de "verdade politicamente correta", realmente, na alma liberal se esconde o monstro socialista.

COM A INTELIGÊNCIA SENTIMOS, DESEJAMOS, DECIDIMOS E INVESTIGAMOS



A inteligência é uma harmonia musical composta de sentimento, desejo, vontade e razão.

A filosofia moderna reduziu-se a considerar a inteligência como o mero exercício do elemento racional, e, pior, somente considera o aspecto racional em sua forma discursiva, como se palavras e abstrações mentais fossem realidades mais tangíveis que a própria realidade concreta.

A chave teórica dos quatro discursos, proposta por Olavo de Carvalho, nos habilita a afirmar que a inteligência principia pelo sentimento, que é um fruto direto da percepção estabelecida no contato com a realidade concreta em seu nível empírico e intuitivo, que possibilita o desenvolvimento do discurso mito-poético, esta linguagem do ponto vista antropológico recebe um forte aporte quando enfocado pela teoria mimética de René Girard.

A poética é forma inicial da linguagem que processa a percepção primária em formas imaginativas de representação simbólica do real, é o salto no ser descrito por Eric Voegelin, justamente por ser a forma que mais entra em contato com o esplendor da criação, e de onde se origina a linguagem simbólica grávida de significados, cujos infinitos sentidos são decantados nos demais níveis da linguagem.

O desejo de se impor perante seus pares é o instinto humano essencial, e, com base em posturas que postulam a dominância nas relações interpessoais cria-se a linguagem retórica, que nada mais é que o domínio da linguagem para defesa de interesses e objetivos pessoais na luta pelo poder social.

Mas, como necessitamos viver em sociedade, e como há resistências que devem ser vencidas constantemente, e, constata-se que quando é excluída a possibilidade de exercício da força e da violência pura e simples, há a necessidade de ser estabelecido um acordo de vontades para possibilitar o confronto controlado (dialético) das retóricas.

O objetivo de obter o consenso é o de estabelecer instituições que dependem de trocas e acordos possibilitadores do convívio em sociedade, assim, a vontade de coexistir deverá obter meios de gerenciar os desejos e os sentimentos interindividuais para possibilitar a discussão civilizada e política, este é padrão da linguagem dialética, o meio pela qual a linguagem investiga a realidade e obtém padrões conceituais e de conduta que podem ser aceitos como verdades estabelecidas e são condições de possibilidade para sobrevivência da comunidade.

A linguagem dialética é fértil por adotar o referido modelo investigativo, que imprime o hábito da racionalidade no processo de discussão de fenômenos e idéias, e, quanto mais aperfeiçoado o método dialético, mais clareza se obtém na formulação de conceitos e descrições de fatos, ao ponto de estabelecer certezas que influirão no processo de criação da própria ciência.

Prosseguindo-se nesse processo revelam-se os marcos práticos e teóricos da razão, que na posse das premissas reveladas nas etapas anteriores, é capaz de promover raciocínios silogísticos, que instrumentalizam a linguagem lógica, que é a forma de expressão do conhecimento científico, mas sua base é o processo de investigação dialética.

Ora, o momento decisório é a situação na qual há necessidade de se obter algum nível de certeza, a ciência bem estabelecida é tal qual uma arte premonitória, pois estabelece corretamente as relações de causa e efeito, que são tão bem expressas pelas estruturas silogísticas.

Sentimos, desejamos, decidimos e investigamos a realidade com nossa inteligência, pois é inegável que nunca deixaremos de nos deleitar em contemplar o arranjos que presenciamos na criação.

Werner Nabiça Coêlho

QUEM MANDA NAS MINHAS IDÉIAS?



Quem manda nas minhas idéias? 

Ao longo dos anos fui agraciado com algumas jóias, que passo a inventariar:

A ontologia aristotélica (com sua causa primeira que funda a verdade da realidade objetiva);

A teoria das idéias platônicas (que explica o caráter metafísico e eterno da verdade e inteligência da criação);

A teoria dos quatro discursos (que explica organicamente a relação entre poética, retórica, dialética e lógica) de Olavo de Carvalho;

A teoria do desejo mimético de René Girard (cujo mecanismo mimético criador do bode expiatório esclarece a fundação da cultura desde seu nível de criação da expressão verbal até à própria boa nova cristã, segundo uma perspectiva antropológica que justifica a necessidade do sagrado como mecanismo contentor da violência);

A teoria da causalidade vertical de Wolfgang Smith (que demonstra a existência da permanência da criação a partir das descobertas científicas da física quântica), que por sinal é um aplicação da teoria do hilemorfismo de Aristóteles (que demonstra a unidade essencial da forma e da substância de um determinado ser);

Lembro que o Estagirita também me presenteou com a teoria das quatro causas (formal, material, substancial e final), não posso esquecer da teoria tridimensional do direito do Miguel Reale (fato, valor e norma).

Daí volto ao Olavo e sua teoria do meta-capitalismo e suas extensas demonstrações sobre a natureza da economia e da sociedade utilizando-se dos fundamentos teóricos a respeito do mito e do símbolo segundo as bases de Eric Voegelin e Shelling, daí, com base em alguns outros autores (Alain Peyrefitte, Bertrand de Jouvenel, Pascal Bernardin, Richard Pipes, Jeffrey Richard Nyquist e outros que foram introduzidos pelo Olavo no abecedário nacional), e lembro dos discípulos do COF, aos quais me furto de indicar para que não vire uma listagem sem fim.

Penso que quem manda nas minhas idéias ainda sou eu, mais pelo menos sei quem anda me enviando os suprimentos e alicerces de minha cabana intelectual.

Werner Nabiça Coêlho

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS: TEMPO E ESPAÇO SÃO SUCESSIVIDADE E SIMULTANEIDADE (CAP. 06 - D)



Observações preliminares.

O Filósofo Mário Ferreira dos Santos sempre advertia no início de suas obras a respeito da importância do vocabulário, e, principalmente, de seu elemento etimológico, e, já nos idos dos anos 1960 ele alertava que utilizaria certas consoantes mudas, já em desuso, mas muito importantes para "apontar étimos que facilitem a melhor compreensão da formação histórica do têrmo empregado", e, em razão desta técnica de exposição, escolhi realizar as transcrições do texto em seu formato gramatical original (com exceção das tremas).


É fundamental da filosofia pitagórico-platônica a presença do allós, do outro, como o khosmos, que é outro que o Ser Supremo. O khosmos implica heterogeneidade, implica o héteros, o outro, distinto, e o modo de ser especìficamente êste ou aquêle é o modo de ser que é outro que outro. A afirmação do Ser Supremo implica o allós, porque é, unìvocamente, êle mesmo, e em plenitude ontológica êle mesmo, e também o poder de realizar tudo quanto pode ser, o que pode vir-a-ser, os possíveis, que são outros que outros. A afirmação do Ipsum Esse, o ser si mesmo, exige o ser outro, o conjunto das coisas outras, allós.

O que é outro que outro, só pode ser tal, simultânea ou sucessivamente pois a disjunção é perfeita, como vimos, o fundamento é, pois, ontológico e não psicológico apenas, como o queria Kant. Dêste modo, o que fundamenta o espaço é a simultaneidade, como o que fundamenta o tempo é a sucessividade. Estas, ontològicamente, antecedem aquêle, e o existir outro, que é o existir heterogêneo, das coisas que não são em plenitude ontológica, implica a presença da simultaneidade e da sucessividade. E a sensibilidade do ser psicològicamente organizado não poderia ser distinta, pois não haveria sensação sem o outro que outro, porque sentir é afirmar, de certo modo, outro que outro, e essa afirmação implica a copresença da simultaneidade e da sucessão, em graus maiores ou menores.


Dêste modo, o tempo e o espaço, que para Kant são formas puras da sensibilidade, são, realmente, esquemas posteriores, que se fundamentam na simultaneidade e na sucessão, que são primordiais, não só da sensação, como do próprio existir e do ser, o que lhes dá uma razão ontológica (1). E é esta razão ontológica que empresta validez e segurança à experiência no sentido kantiano, a qual termina por desvanecer-se quanto ao seu valor, como vimos na análise que fizemos da obra daquele autor em "Filosofia Concreta" e, sobretudo, em "As três Críticas de Kant".

A justificação da continuidade da extensão, considerada não só matemática, como fisicamente, fundamenta-se na não coincidência das partes, que se dão umas extra às outras. As coisas quantitativas são compostas de partes extra partes, mas, por serem estas tomadas extensivamente, são divisíveis em partes, pois onde há extensão há distância. Esta, enquanto tal, é homogeneamente ela mesma em sua especificidade, e, considerada matemàticamente é, portanto, divisível em partes extensas in infinitum. Todo modo de ser quantitativo é, pois, enquanto tal, divisível in infinitum, quando considerado em sua extensidade.



A extensão pode ser considerada como actual ou como virtual. É actual aquela que tem de fato partes extra partes, as quais não coincidem todas no mesmo ponto. Essa extensão pode ainda ser local e não-local. É local, quando comensurada com o lugar, como o são os corpos. É não-local, quando incomensurável com o lugar, quando é toda no todo e toda em cada uma das suas partes singulares, cuja realidade é matéria controversa. Contudo, no caso dos anti-prótons, que revelam, ao anular os prótons, que o resultado não tem extensidade apta a ser captada pelos sentidos, ampliados por instrumentos, não se pode admitir que esse resultado seja uma aniquilação total do ser, o que é ontologicamente impossível e, portanto, absurdo, como o provamos em "Filosofia Concreta". O que resulta, a chamada anti-matéria na física moderna é anulação da extensão atual ou potencial, mas, se for a primeira, será não-local.



Chamam, ainda, de extensão aptitudinal o accidente que tem partes integrantes (que são as que não constituem a essência de uma coisa, pois estas são as partes essenciais). As partes essenciais são aquelas que, faltando apenas uma, a coisa deixa de ser o que é. Constituem elas a essência do todo. Assim a animalidade e a racionalidade são partes essenciais do homem, pois faltando uma ou outra, o homem deixa de ser tal. A parte integrante, ao inverso, não constitui a essência do todo, e a ausência de uma não implica a perda da especificidade, como a falta de um braço não leva ao desaparecimento do homem. Estas partes integrantes são chamadas de homogêneas ou heterogêneas. As homogêneas são entre si semelhantes especificamente, e até acidentalmente, como as partes de um pedaço de ferro, enquanto ferro. São heterogêneas aquelas que diferem entre si accidentalmente, como o são as partes de um ser vivo.

Pergunta-se, na Cosmologia, e é um dos seus grandes problemas, qual o efeito formal da quantidade: é dar extensão entitativa à substância, ou dar extensão actual local ou não local, ou dar uma extensão aptitudinal, ou a exigência da extensão?

É mister, em primeiro lugar, saber o que se entende por efeito formal. É o que resulta da comunicação da forma com o seu sujeito. Assim o efeito formal da côr é o colorido, do calor o ser quente. Classifica-se, ainda, o efeito formal em primário e secundário. É primário o que não pode deixar de dar-se sem contradição, desde que a forma seja dada. Se se dá o calor, tem de se dar o quente; se há cogitação no intelecto, êste está em ato. Secundário é o que, exigida a forma, se faltar, não implica contradição.

(1) O existir ou o ser implicam o que existe ou é, simultânea ou sucessivamente, ou ambos, já que a disjunção é perfeita e a não aceitação seria a negação do sujeito, pois se não é nem simultânea, nem sucessivamente, nem ambos, não é, nem existe.

Mário Ferreira dos Santos, Erros na Filosofia da Natureza, Coleção Uma Nova Consciência, Editora Matese, São Paulo, 1967, p.36-39