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sexta-feira, 22 de maio de 2020

REFLETINDO SOBRE A NOVA RELIGIÃO DA EUGENIA DO COVID-1984

A máscara hospitalar é o novo símbolo da religião sacrificial da eugenia, quem não utilizar tal veste de forma contínua arrisca-se a ser considerado impuro e iníquo passível de ser considerado um zumbi, um não-humano cuja existência deverá ser urgentemente eliminada pelo bem comum.

***

Não somos livres para escolher como viver ou morrer perante o deus sacrificial da eugenia, a liberdade nada vale diante da igualdade saudável gerida pelos poderes estatais que nos consideram um bom plantel em seus confortáveis currais, cuja fazenda denomina-se "fique em casa".

***

A saúde pública é motivo social, o culto à igualdade hipocondríaca é a nova religião sacrificial, a eugenia é a ideologia científica que serve de teologia, o medo da morte é a filosofia, e, por fim, o dado antropológico fundamental é um povo acovardado pelo medo da morte mimeticamente estimulado pelos senhores do mundo da política e da mídia.

***

A nova religião sacrificial é a eugenia, que sacraliza a vida saudável, persegue quem não acata a ciência sagrada e infalível, e premia os fiéis com a garantia da promessa de vida longeva com base nos futuros avanços da medicina, futuro sempre adiado.

sábado, 25 de fevereiro de 2017

A EUGENIA ONTEM E HOJE

Sir Francis Galton (1822-1911)

Bioética é um ramo da ética, e a ética por sua vez é um galho que emerge da grande árvore da reflexão filosófica, esta é uma planta cuja origem está no afeto do ser humano ao bem, e ao natural sentimento de dúvida e admiração que resulta do conhecimento da própria ignorância, e da necessidade de suprir tal carência.
 


Aristóteles ao tratar da definição de filosofia descreve que seu objeto é "especular sobre os princípios e as causas, pois o bem e o fim das coisas é uma causa"(1), e constata:
De fato, os homens começaram a filosofar, agora como na origem, por causa da admiração, na medida em que, inicialmente, ficavam perplexos diante das dificuldades mais simples; em seguida progredindo pouco a pouco, chegaram a enfrentar problemas sempre maiores [...]. Ora, quem experimenta uma sensação de dúvida e de admiração reconhece que não sabe; e é por isso que também aquele que ama o mito é, de certo modo, filósofo: o mito com efeito, é constituído por um conjunto de coisas admiráveis. De modo que, se os homens filosofaram para libertar-se da ignorância, é evidente que buscavam o conhecimento unicamente em vista do saber e não por alguma utilidade prática. (2)


Na perspectiva aristotélica, podemos afirmar que a ética, também, origina-se na reflexão sobre a conduta humana, que tanto nos deixa espantados, admirados e perplexos.

Alguns posicionamentos bioéticos espantosos sobre a eugenia estão em debate no países do Atlântico Norte, lembrando que eugenia significa "bem-nascido".

Com base na obra "Contra a perfeição" de Michael J. Sandel, relata que Francis Galton, primo de Charles Darwin, em 1883, aplicou métodos estatísticos ao estudo da hereditariedade, e, com base nisso, defendeu uma nova filosofia naturalista da ciência:
O que a natureza faz às cegas, devagar e de modo grosseiro, os homens podem fazer de modo providente, rápido e gentil (...). O aprimoramento de nossa raça me parece ser um dos mais elevados objetivos que podemos buscar racionalmente (5)
 
Em 1910 Charles B. Davenport abriu o Eugenic Records Office em Cold Spring Harbor, Long Island, para desenvolver pesquisas no sentido de evitar a reprodução dos geneticamente desqualificados.


Margaret Sanger, pioneira do feminismo e do controle de natalidade defendia a eugenia, para que "Mais crianças dos qualificados, menos dos desqualificados – essa é a principal questão do controle de natalidade" (6)



Nos anos 1920 cursos de eugenia eram ministrados em 350 faculdades e universidades dos Estados Unidos, para alertar os jovens americanos para o seu dever reprodutor.

Em 1907 o Estado de Indiana adotou a primeira lei de esterilização compulsória para pacientes mentais, prisioneiros e miseráveis, e que 29 Estados americanos acabaram adotando leis de esterilização compulsória "e mais de 60 mil americanos geneticamente ‘defeituosos’ foram esterilizados” (7).

Em 1933 Hitler promulgou uma ampla lei de esterilização que arrancou elogios dos eugenistas americanos, mas ao fim da Segunda Guerra Mundial, as atrocidades cometidas provocaram o recuo do movimento eugenista norte-americano.



Atualmente, vieram à tona diversos dilemas relativos à engenharia genética e clonagem humana, e, assim criou-se um debate em que:


Os críticos da engenharia genética argumentam que a clonagem humana, o melhoramento genético e a busca por crianças feitas sob encomenda não passam de eugenia ‘privatizada’ ou de ‘livre mercado’. Já os defensores retrucam que as escolhas genéticas feitas livremente não são eugenia, pelo menos não no sentido pejorativo do termo. Retirar o aspecto da coerção, argumentam, é retirar aquilo que torna a eugenia repugnante. (8)

O filósofo do direito Ronald Dworkin também defende uma versão liberal da eugenia. Não há nada de errado na ambição ‘de tornar a vida das futuras gerações de seres humanos mais longa e repleta de talentos e, portanto, de conquistas’, escreve Dworkin. ‘Pelo contrário, se brincar de Deus significa lutar para melhorar a nossa espécie, e trazer para nosso projeto consciente a resolução de melhorar o que Deus deliberadamente ou a natureza cegamente fizeram evoluir ao longo de éons, então o primeiro princípio do individualismo ético comanda essa luta’[...] (9)

Intervir geneticamente para selecionar ou melhorar as crianças é censurável, argumenta Habermas, porque viola os princípios liberais de autonomia e igualdade. Viola a autonomia porque os indivíduos geneticamente programados não podem encarar a si mesmos como os ‘únicos autores de sua própria história de vida’ e prejudica a igualdade na medida em que destrói ‘as relações essencialmente simétricas entre seres humanos livres e iguais’ ao longo das gerações. (10)

[...] a eugenia perpetrada pelos pais é censurável porque expressa e estabelece certa atitude diante do mundo – uma atitude de dominação, que não valoriza o caráter de dádiva das potências e conquistas humanas e desconsidera aquela parcela da liberdade que consiste em uma persistente negociação com aquilo que nos é dado. (11)

Num mundo social que preza o domínio e o controle, a experiência de ser pai ou mãe é uma escola de humildade. O fato de nos importarmos profundamente com nossos filhos mas não podermos escolher o tipo de filhos que queremos ensina os pais a se abrirem ao imprevisto. (12)

Os maiores riscos são de dois tipos. Um deles envolve o destino dos bens humanos encarnados em importantes práticas sociais – os preceitos do amor incondicional e abertura ao imprevisto, no caso da experiência parental; a celebração dos talentos e dos dons naturais nas artes e nos esportes; a humildade diante do privilégio próprio e a disposição de partilhar os frutos da sua boa fortuna por meio de mecanismos de solidariedade social. O outro diz respeito a nossa orientação em relação ao mundo que habitamos e ao tipo de liberdade ao qual aspiramos (13)
[...] é possível ver a engenharia genética como a expressão máxima de nossa decisão de subjugar o mundo, como mestres de nossa própria natureza. Essa visão da liberdade, entretanto, é falha. Ela ameaça banir a valorização da vida como dádiva e nos deixar sem nada para defender ou contemplar além da nossa própria vontade. (14)

Os fundamentos da eugenia, que resultam do molde teórico darwinista, exigem o sacrifício dos menos aptos no altar da religião da razão científica, que possui a fé no naturalismo materialista e nihilista.

Se, no teatro de nossos pensamentos, buscarmos base de conduta moral, em teorias que se definem na necessidade de preservação dos mais aptos, naturalmente, seremos encaminhados, por tais raciocínios supostamente científicos, a sermos defensores da eugenia.

A eugenia é um método de eliminação sistemática dos menos aptos, com base numa metodologia científica de ideologia darwinista, não importa se tal modelo de conduta moral é oriundo de um Poder de Império Estatal, ou é oriundo de um suposto liberalismo individualista que se justifica em alegadas boas intenções, ambas as posturas possuem fundamento último na "vontade de poder" ao gosto de Nietzsche.



NOTAS:

(1) Aristóteles, Metafísica, 982b 10, Volume II, 5.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2015, p. 11
(2) loc. cit.
(3) SANDEL, Michael J. Contra a perfeição : ética na era da engenharia genética; tradução Ana Carolina Mesquita. – 1.ed. – Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2013, p. 77
(4) op. cit, p. 78
(5) op. cit., p. 79
(6) op. cit., p. 81
(7) op. cit., p. 88
(8) op. cit., p. 91
(9) op. cit., p. 93
(10) op. cit., p. 98
(11) op. cit., p. 107
(12) op. cit., p. 109

domingo, 22 de maio de 2016

DIREITOS HUMANOS E BIODIREITO - MATERIAL DA AULA MINISTRADA EM 21/05/2016

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO PROFISSIONAL ENSINO EM SAÚDE NA AMAZÔNIA
DIREITOS HUMANOS E BIODIREITO
RODA DE CONVERSA
WERNER NABIÇA COÊLHO


Ao ser convidado a participar desta roda de conversa sobre um novo ramo da ciência jurídica, denominado biodireito, confesso que me vi na desconcertante e agradável situação de buscar a definição de tal termo.

E, uma vez que passei a vista em alguns artigos, com suas respectivas definições doutrinárias, acabei descobrindo que biodireito é a positivação das regras e princípios da bioética.

Vejamos o que Enéas Castilho Chiarini Júnior diz a respeito do tema:

2.2 - Bioética: Macro-bioética e micro-bioética
Quanto à Bioética, esta poderia ser considerada, de forma bem simplificada, como sendo a ética da vida -Bio + Ética.
Neste sentido, poder-se-ia dividir a Bioética em dois grandes ramos: Macro-bioética e Micro-bioética.

Macro-bioética seria a ética que visa o bem da vida em sentido amplo -direcionada ao macro-sistema da vida-, e estaria diretamente ligada ao meio ambiente e ao Direito Ambiental.

Neste contexto, Bioética seria um modelo de conduta que pudesse ser capaz de trazer o bem ao meio-ambiente.

Em decorrência da macro-bioética ter-se-ia um código de condutas que deveriam ser seguidas em todo tipo de ação humana -principalmente nas experimentações científicas- que pudesse trazer como conseqüência uma alteração -quer seja benéfica, quer seja prejudicial- ao meio-ambiente.

A micro-bioética, por sua vez, surgiria de uma restrição do objeto da bioética. Seria a ética da vida humana.

Neste contexto, Bioética seria um modelo de conduta que procurasse trazer o bem à Humanidade como um todo, e, ao mesmo tempo, a cada um dos indivíduos componentes da Humanidade.

É neste sentido que, perante os avanços médico-científico-tecnológicos, tem-se utilizado os termos "Bioética" e "Biodireito", no sentido de proteção da vida humana, principalmente com o intuito de proteger todos os seres humanos que estejam direta, ou indiretamente, envolvidos em experimentos científicos.

2.3 - Biodireito

Desta forma, chega-se ao conceito de "Biodireito", que seria, justamente, a positivação -ou a tentativa de positivação- das normas bioéticas.

Biodireito seria, portanto, a positivação jurídica de permissões de comportamentos médico-científicos, e de sanções pelo descumprimento destas normas.

Biodireito é um termo que pode ser entendido, também, no sentido de abranger todo o conjunto de regras jurídicas já positivadas e voltadas a impor -ou proibir- uma conduta médico-científica e que sujeitem seus infratores às sanções por elas previstas.

Desta maneira, pode-se dizer de forma mais concisa que Biodireito é o conjunto de leis positivas que visam estabelecer a obrigatoriedade de observância dos mandamentos bioéticos, e, ao mesmo tempo, é a discussão sobre a adequação -sobre a necessidade de ampliação ou restrição- desta legislação (1)

Tudo bem! Então biodireito é a positivação das normas desenvolvidas pela reflexão bioética!

Para quem não é do ramo jurídico, esta definição é cabalística, afinal, o que é positivação?

Bom, como minha carreira docente é eminentemente de professor da disciplina de introdução ao estudo do direito, devo ministrar uma breve aula sobre o assunto, então vamos lá:

  1. O Direito é um fenômeno social, cuja diferença específica das demais situações normativas sociais é destacado pelo uso da força socialmente organizada para imposição de sua obrigatoriedade, em suma, o direito é uso organizado e legítimo da violência social;

  1. As normas jurídicas, portanto, são normas sociais obrigatórias e impostas com base no uso da força, o que tecnicamente é denominado de coercibilidade jurídica, quando previsto em abstrato na regra, e coatividade jurídica quando a regra é aplicada por meio de sanções jurídicas ao caso concreto (multas, penas, prisões, perda de direitos, restrições de direitos, indisponibilidade de bens, etc.);

  1. Ora, o objeto da ciência jurídica é o conjunto de todas as normas jurídicas, que podem ser classificadas inicialmente num grande conjunto universo, ou seja, algo que é tradicionalmente denominado de direito objetivo, pois as normas sociais são exteriores ao sujeito submetido por elas, são obstáculos que devem ser considerados, são pedras de tropeço na vida de cada um, que em caso de desobediência podem gerar severas consequências impostas pelo corpo social;

  1. Dentro deste conjunto podem ser identificadas normas jurídicas oriundas de condutas reiteradas consideradas obrigatórias, como os costumes, de ajustes contratuais voluntários, de decisões judiciais, de atos da Administração Pública, mas, no conjunto de tantas espécies, aquela que serve de principal objeto de estudo para a ciência jurídica é a norma legal, também denominada de direito positivo;

  1. Não se deve confundir a expressão direito positivo como algo oriundo da escola filosófica e/ou sociológica do Positivismo de Augusto Comte, que nos influenciou na escolha da frase de nossa bandeira nacional;

  1. Quanto tratamos da idéia de direito positivo, como direito legal, cuja fonte é a norma jurídica positiva, estamos a falar de uma norma social de caráter jurídico, promovida mediante um processo legislativo próprio, operado por autoridade competente, que possui os requisitos formais da publicidade, imperatividade, abstração, generalidade, vigência e eficácia, se levarmos em contra o modelo proposto por Kelsen, há ainda formas mais sofisticadas de ser abordado o tema da norma jurídica, como no caso de utilização do marco teórico das teorias retóricas, que analisam a norma jurídica com base numa abordagem linguística (2);

  1. Em síntese, quando o Estado cria norma legais (direito positivo) que tratam de assuntos relacionados ao comportamento bioético, teremos o biodireito.

Agora é o momento de ser ressaltado que não existem ramos do direito autônomos ou independentes entre si, o que há é uma unidade fenomênica no universo jurídico.

A unidade do direito é um princípio pela qual se compreende que as normas se estruturam na forma de uma sistema normativo aberto às influências do meio social, e, portanto, quando se realiza uma divisão do direito em seus diversos ramos, tal metodologia tem valor meramente didático.

Assim sendo, quando se fala em biodireito, indica-se a existência de um conjunto de normas jurídicas que objetivam regular condutas éticas resultantes das consequências dos avanços tecnológicos, que afetam a qualidade de vida, tanto em seu aspecto individual como em uma abrangência ambiental.

Todavia, se biodireito é a formalização jurídica das regras aplicáveis com fundamento na bioética, então, deve-se questionar: que é bioética?

Bioética é um ramo da ética, e a ética por sua vez é um galho que emerge da grande árvore da reflexão filosófica, esta é uma planta cuja origem está no afeto do ser humano ao bem, e ao natural sentimento de dúvida e admiração que resulta do conhecimento da própria ignorância, neste passo citamos Aristóteles que ao tratar da definição de filosofia como ciência que "deve especular sobre os princípios e as causas, pois o bem e o fim das coisas é uma causa"(3) nos ensina:

De fato, os homens começaram a filosofar, agora como na origem, por causa da admiração, na medida em que, inicialmente, ficavam perplexos diante das dificuldades mais simples; em seguida progredindo pouco a pouco, chegaram a enfrentar problemas sempre maiores [...]. Ora, quem experimenta uma sensação de dúvida e de admiração reconhece que não sabe; e é por isso que também aquele que ama o mito é, de certo modo, filósofo: o mito com efeito, é constituído por um conjunto de coisas admiráveis. De modo que, se os homens filosofaram para libertar-se da ignorância, é evidente que buscavam o conhecimento unicamente em vista do saber e não por alguma utilidade prática. (4)

Esta tradução descreve a origem do filosofar na admiração, há outras traduções que no lugar de admiração apresentam o termo espanto, o que dá uma conotação até poética ao momento filosófico em seu sentido humano.

A reflexão filosófica principia pelo espanto e pela perplexidade, pois bem, diante da perspectiva aristotélica podemos afirmar que a ética, também, origina-se na reflexão sobre a conduta humana, que tanto nos deixa espantados, admirados e perplexos.

Vamos, agora, tratar de alguns posicionamentos bioéticas espantosos relativos aos direitos humanos, e levantamos como exemplo o polêmico tema relativo à eugenia, que está em debate no países do Atlântico Norte, lembrando que eugenia significa bem-nascido.

Sandel noticia que Francis Galton, primo de Charles Darwin, em 1883 aplicou métodos estatísticos ao estudo da hereditariedade, com base nisso defendeu uma nova religião, pois dizia:

O que a natureza faz às cegas, devagar e de modo grosseiro, os homens podem fazer de modo providente, rápido e gentil (...). O aprimoramento de nossa raça me parece ser um dos mais elevados objetivos que podemos buscar racionalmente (5)

Em 1910 Charles B. Davenport abriu o Eugenic Records Office em Cold Spring Harbor, Long Island, para desenvolver pesquisas no sentido de evitar a reprodução dos geneticamente desqualificados.

Margaret Sanger, pioneira do feminismo e do controle de natalidade defendia a eugenia, para que "Mais crianças dos qualificados, menos dos desqualificados – essa é a principal questão do controle de natalidade" (6)

Nos anos 1920 cursos de eugenia em ministrados em 350 faculdades e universidades dos Estados Unidos, para alertar os jovens americanos para o seu dever reprodutor.

Sandel relata, ainda, que em 1907 o estado de Indiana adotou a primeira lei de esterilização compulsória para pacientes mentais, prisioneiros e miseráveis, e que 29 Estados americanos acabaram adotando leis de esterilização compulsória "e mais de 60 mil americanos geneticamente ‘defeituosos’ foram esterilizados” (7).

Em 1933 Hitler promulgou uma ampla lei de esterilização que arrancou elogios dos eugenistas americanos, mas ao fim da Segunda Guerra Mundial, as atrocidades cometidas provocaram o recuo do movimento eugenista norte-americano.

Atualmente, vieram à tona diversos dilemas relativos à engenharia genética e clonagem humana, pelo que cito abaixo algumas passagens muito interessantes a respeito do debate suscitado nos Estados Unidos:

Os críticos da engenharia genética argumentam que a clonagem humana, o melhoramento genético e a busca por crianças feitas sob encomenda não passam de eugenia ‘privatizada’ ou de ‘livre mercado’. Já os defensores retrucam que as escolhas genéticas feitas livremente não são eugenia, pelo menos não no sentido pejorativo do termo. Retirar o aspecto da coerção, argumentam, é retirar aquilo que torna a eugenia repugnante. (8)

O filósofo do direito Ronald Dworkin também defende uma versão liberal da eugenia. Não há nada de errado na ambição ‘de tornar a vida das futuras gerações de seres humanos mais longa e repleta de talentos e, portanto, de conquistas’, escreve Dworkin. ‘Pelo contrário, se brincar de Deus significa lutar para melhorar a nossa espécie, e trazer para nosso projeto consciente a resolução de melhorar o que Deus deliberadamente ou a natureza cegamente fizeram evoluir ao longo de éons, então o primeiro princípio do individualismo ético comanda essa luta’[...] (9)

Intervir geneticamente para selecionar ou melhorar as crianças é censurável, argumenta Habermas, porque viola os princípios liberais de autonomia e igualdade. Viola a autonomia porque os indivíduos geneticamente programados não podem encarar a si mesmos como os ‘únicos autores de sua própria história de vida’ e prejudica a igualdade na medida em que destrói ‘as relações essencialmente simétricas entre seres humanos livres e iguais’ ao longo das gerações. (10)

a eugenia perpetrada pelos pais é censurável porque expressa e estabelece certa atitude diante do mundo – uma atitude de dominação, que não valoriza o caráter de dádiva das potências e conquistas humanas e desconsidera aquela parcela da liberdade que consiste em uma persistente negociação com aquilo que nos é dado. (11)

Num mundo social que preza o domínio e o controle, a experiência de ser pai ou mãe é uma escola de humildade. O fato de nos importarmos profundamente com nossos filhos mas não podermos escolher o tipo de filhos que queremos ensina os pais a se abrirem ao imprevisto. (12)

Os maiores riscos são de dois tipos. Um deles envolve o destino dos bens humanos encarnados em importantes práticas sociais – os preceitos do amor incondicional e abertura ao imprevisto, no caso da experiência parental; a celebração dos talentos e dos dons naturais nas artes e nos esportes; a humildade diante do privilégio próprio e a disposição de partilhar os frutos da sua boa fortuna por meio de mecanismos de solidariedade social. O outro diz respeito a nossa orientação em relação ao mundo que habitamos e ao tipo de liberdade ao qual aspiramos (13)

é possível ver a engenharia genética como a expressão máxima de nossa decisão de subjugar o mundo, como mestres de nossa própria natureza. Essa visão da liberdade, entretanto, é falha. Ela ameaça banir a valorização da vida como dádiva e nos deixar sem nada para defender ou contemplar além da nossa própria vontade. (14)

Podemos buscar os fundamentos da eugenia numa certa postura científica de molde darwinista, pois modernamente vivenciamos o mito da soberania do método científico, e um dos livros sagrados da ciência contemporânea é a Origem das Espécies.

Logo, se no teatro de nossos pensamentos buscamos como nossa base de conduta moral uma teoria que define a necessidade de preservação somente dos mais aptos, naturalmente, seremos defensores da eugenia, que é um método de eliminação sistemática dos menos aptos, com base numa metodologia científica.

Agora, faço uma citação de alguns textos legais em vigor no Brasil, e levemos a leitura dos mesmos para o campo da reflexão bioética, em matéria de nascituro no Código Civil (15) e na Lei nº 11.804/2008 (16), que disciplinou os alimentos gravídicos:

Código Civil

Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.

Art. 1.779. Dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecer estando grávida a mulher, e não tendo o poder familiar.
Parágrafo único. Se a mulher estiver interdita, seu curador será o do nascituro.

Art. 1.798. Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:
I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão;

Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

Lei nº 11.804/2008

Art. 2º Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.

Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.

Os citados dispositivos da legislação civil que definem direitos ao nascituro de: ser donatário, ser curatelado, ser herdeiro e ser alimentando, inclusive, é importante mencionar o art. 1.798 do Código Civil que refere-se as pessoas nascidas ou já concebidas, postos estes elementos podemos abordar em nossa roda de conversa uma série de decisões judiciais e outros temas normativos relacionados à bioética e aos direitos humanos que vieram à tona nos últimos anos.

NOTAS:
(1) Enéas Castilho Chiarini Júnior, Noções introdutórias sobre Biodireito, acesso em 19/05/2016, disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4141
(2) Nilson Nunes da Silva Junior, Breves considerações sobre o conceito de norma jurídica, acesso em 19/05/2016, disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7276
(3) Aristóteles, Metafísica, 982b 10, Volume II, 5.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2015, p. 11
(4) Aristóteles, Metafísica, 982b 10-20, Volume II, 5.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2015, p. 11
(5) SANDEL, Michael J. Contra a perfeição : ética na era da engenharia genética; tradução Ana Carolina Mesquita. – 1.ed. – Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2013, p. 77
(6) op. cit, p. 78
(7) op. cit., p. 79
(8) op. cit., p. 81
(9) op. cit., p. 88
(10) op. cit., p. 91
(11) op. cit., p. 93
(12) op. cit., p. 98
(13) op. cit., p. 107
(14) op. cit., p. 109
(15) BRASIL. Lei Ordinária n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Diário da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 11/02/2002
(16) BRASIL. Lei Ordinária n.º 11.804, de 05 de novembro de 2008 Diário da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 06/11/2008

ANEXOS

Acórdão STF - Direito à Saúde- Fornecimento de Medicamentos - Solidariedade Entes Federativos
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE (ART. 196, CF). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. CHAMAMENTO AO PROCESSO. DESLOCAMENTO DO FEITO PARA JUSTIÇA FEDERAL. MEDIDA PROTELATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O artigo 196 da CF impõe o dever estatal de implementação das políticas públicas, no sentido de conferir efetividade ao acesso da população à redução dos riscos de doenças e às medidas necessárias para proteção e recuperação dos cidadãos. 2. O Estado deve criar meios para prover serviços médico-hospitalares e fornecimento de medicamentos, além da implementação de políticas públicas preventivas, mercê de os entes federativos garantirem recursos em seus orçamentos para implementação das mesmas. (arts. 23, II, e 198, § 1º, da CF). 3. O recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios. Isto por que, uma vez satisfeitos tais requisitos, o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional. 4. In casu, o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida. 5. Agravo regimental no recurso extraordinário desprovido.

(RE 607381 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 31/05/2011, DJe-116 DIVULG 16-06-2011 PUBLIC 17-06-2011 EMENT VOL-02546-01 PP-00209)




STF e o processo que liberou pesquisas com células-tronco embrionárias

O Supremo Tribunal Federal julgou que as pesquisas com células-tronco embrionárias não violam o direito à vida, tampouco a dignidade da pessoa humana. Esses argumentos foram utilizados pelo ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3510) ajuizada com o propósito de impedir essa linha de estudo científico.
Para seis ministros, portanto a maioria da Corte, o artigo 5º da Lei de Biossegurança não merece reparo. Votaram nesse sentido os ministros Carlos Ayres Britto, relator da matéria, Ellen Gracie, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio e Celso de Mello.
Os ministros Cezar Peluso e Gilmar Mendes também disseram que a lei é constitucional, mas pretendiam que o Tribunal declarasse, em sua decisão, a necessidade de que as pesquisas fossem rigorosamente fiscalizadas do ponto de vista ético por um órgão central, no caso, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). Essa questão foi alvo de um caloroso debate ao final do julgamento e não foi acolhida pela Corte.
Outros três ministros disseram que as pesquisas podem ser feitas, mas somente se os embriões ainda viáveis não forem destruídos para a retirada das células-tronco. Esse foi o entendimento dos ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Ricardo Lewandowski e Eros Grau. Esses três ministros fizeram ainda, em seus votos, várias outras ressalvas para a liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias no país.
Veja abaixo os argumentos de cada ministro, na ordem de votação da matéria.
Carlos Ayres Britto (relator)
Relator da ADI 3510, o ministro Carlos Ayres Britto votou pela total improcedência da ação. Fundamentou seu voto em dispositivos da Constituição Federal que garantem o direito à vida, à saúde, ao planejamento familiar e à pesquisa científica. Destacou, também, o espírito de sociedade fraternal preconizado pela Constituição Federal, ao defender a utilização de células-tronco embrionárias na pesquisa para curar doenças.
Carlos Britto qualificou a Lei de Biossegurança como um “perfeito” e “bem concatenado bloco normativo”. Sustentou a tese de que, para existir vida humana, é preciso que o embrião tenha sido implantado no útero humano. Segundo ele, tem que haver a participação ativa da futura mãe. No seu entender, o zigoto (embrião em estágio inicial) é a primeira fase do embrião humano, a célula-ovo ou célula-mãe, mas representa uma realidade distinta da pessoa natural, porque ainda não tem cérebro formado.
Ele se reportou, também, a diversos artigos da Constituição que tratam do direito à saúde (artigos 196 a 200) e à obrigatoriedade do Estado de garanti-la, para defender a utilização de células-tronco embrionárias para o tratamento de doenças.
[...]
Carlos Alberto Menezes Direito
De forma diversa do relator, o ministro Menezes Direito julgou a ação parcialmente procedente, no sentido de dar interpretação conforme ao texto constitucional do artigo questionado sem, entretanto, retirar qualquer parte do texto da lei atacada. Segundo Menezes Direito, as pesquisas com as células-tronco podem ser mantidas, mas sem prejuízo para os embriões humanos viáveis, ou seja, sem que sejam destruídos.
Em seis pontos salientados, o ministro propõe ainda mais restrições ao uso das células embrionárias, embora não o proíba. Contudo, prevê maior rigor na fiscalização dos procedimentos de fertilização in vitro, para os embriões congelados há três anos ou mais, no trato dos embriões considerados "inviáveis", na autorização expressa dos genitores dos embriões e na proibição de destruição dos embriões utilizados , exceto os inviáveis. Para o ministro Menezes Direito, “as células-tronco embrionárias são vida humana e qualquer destinação delas à finalidade diversa que a reprodução humana viola o direito à vida”.
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Joaquim Barbosa
Ao acompanhar integralmente o voto do relator pela improcedência da ação, o ministro Joaquim Barbosa ressaltou que a permissão para a pesquisa com células embrionárias prevista na Lei de Biossegurança não recai em inconstitucionalidade. Ele exemplificou que, em países como Espanha, Bélgica e Suíça, esse tipo de pesquisa é permitida com restrições semelhantes às já previstas na lei brasileira, como a obrigatoriedade de que os estudos atendam ao bem comum, que os embriões utilizados sejam inviáveis à vida e provenientes de processos de fertilização in vitro e que haja um consentimento expresso dos genitores para o uso dos embriões nas pesquisas. Para Joaquim Barbosa, a proibição das pesquisas com células embrionárias, nos termos da lei, “significa fechar os olhos para o desenvolvimento científico e os benefícios que dele podem advir”.
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Gilmar Mendes
Para o ministro, o artigo 5º da Lei de Biossegurança é constitucional, mas ele defendeu que a Corte deixasse expresso em sua decisão a ressalva da necessidade de controle das pesquisas por um Comitê Central de Ética e Pesquisa vinculado ao Ministério da Saúde. Gilmar Mendes também disse que o Decreto 5.591/2005, que regulamenta a Lei de Biossegurança, não supre essa lacuna, ao não criar de forma expressa as atribuições de um legítimo comitê central de ética para controlar as pesquisas com células de embriões humanos.
Publicado em 29 de maio de 2008 no site do STF



Zika Vírus: a biopolítica dos úteros
Controle das populações ganha nomes originais a depender da época. Já foi eugenia, agora é prevenção. Cada tempo teria sua biopolítica e seus inimigos do bem-estar, permitam-me lembrar Michel Foucault. O infeliz da vez é o zika vírus; e, com pouca originalidade, a população são os úteros das mulheres. O aumento na notificação de recém-nascidos com microcefalia em áreas endêmicas de dengue acendeu a hipótese de que haveria causalidade entre o zika e a má-formação. O Instituto Evandro Chagas encontrou o vírus em tecidos e sangue de um único bebê, e o alarde foi internacional: “Ministério da Saúde confirma relação entre zika vírus e microcefalia”.
Quanta ambiguidade e terror nesse anúncio. Em ciência, “relação” pode ser tudo e nada ao mesmo tempo. Há uma diferença entre causa e relação — o que precisamos saber é se o zika vírus causa a microcefalia no feto. Por que essa diferença importa? Porque relação pode ser erro científico — “o risco de sarampo é maior entre os consumidores de tomates” diz o quê? Que entre as pessoas que gostam de tomate, muitas tiveram sarampo, mas nada sobre a causa do sarampo. Não quero aqui contestar que uma nova descoberta científica possa estar em curso, apenas estranhar como uma hipótese, um único caso de relação comprovada, pode ter sido suficiente para um alerta de saúde pública com consequências importantes para as mulheres. E não quaisquer mulheres, mas as pobres e nordestinas.
Há tempos convivemos com a dengue. O mosquito Aedes aegypti é daqueles cujo nome científico é conhecido sem decoreba de escola. A dengue é doença da vida comum, todas nós conhecemos alguém que já sentiu as dores cortantes do vírus da dengue. A microcefalia no feto é outra ordem de inquietação sanitária — a má-formação não tem cura e, mesmo o diagnóstico sendo feito intraútero, não há direito ao aborto no Brasil. Os dados epidemiológicos anunciam um crescimento de dez vezes nos casos notificados — de pouco mais de cem nos últimos cinco anos, agora identificamos mais de mil recém-nascidos com microcefalia. E os casos são complexos: em alguns bebês, há múltiplas más-formações; em outros, apenas a microcefalia.
Se essa é uma “situação inédita para a pesquisa científica mundial”, segundo o Ministério da Saúde, para a história do controle dos corpos das mulheres, é repetição do já-vivido. A biopolítica tem nas mulheres alvo preferido — não se esperam certezas científicas para anunciar que a melhor prevenção da microcefalia é não engravidar; que para conter o crescimento populacional é preciso restringir número de filhos; que, para que não haja crianças na rua, esterilizar mulheres pobres seria a saída. Esse não é um bom anúncio. A única prevenção ao zika vírus é o controle do mosquito. O resto é política de saúde para amadores.
Debora Diniz é antropóloga, professora da Universidade de Brasília, pesquisadora da Anis – Instituto de Bioética e autora do livro “Cadeia: relatos sobre mulheres” (Civilização Brasileira). Este artigo é parte do falatório Vozes da Igualdade, que todas as semanas assume um tema difícil para vídeos e conversas. Para saber mais sobre o tema deste artigo, siga https://www.facebook.com/AnisBioetica.



REPRODUÇÃO ASSISTIDA

Nem os planos de saúde, nem o Sistema Único de Saúde (SUS) são obrigados a custear técnicas de reprodução. Contudo, alguns casais já têm conseguido, por meio de decisões judiciais,que os planos de saúde arquem com todo o tratamento, inclusive até a paciente engravidar.

Quanto ao SUS, tramitam projetos de lei no Congresso Nacional que objetivam garantir esta cobertura. Hoje, apenas algumas unidades oferecem o tratamento. O Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB), o Hospital da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e o Hospital das Clinicas de Belo Horizonte, são alguns deles.

O que mudou com a Resolução 2.121/15



Resolução 2.013/13 Resolução 2.121/15
Idade máxima para o recebimento de óvulos Até 50 anos Após 50 anos, condicionada à fundamentação técnica e científica e desde que médico e pacientes assumam os riscos em termo de consentimento livre e esclarecido.
Idade máxima para a doação de espermatozoides Até 50 anos Até 50 anos
Idade máxima para a doação de óvulos Até 35 anos Até 35 anos
Número de embriões implantados Mulheres com até 35 anos – até dois embriões; de 36 a 39 anos - até três; de 40 a 50 anos- quatro embriões (limite máximo). Regras foram mantidas
Doação de gametas Não determinava se era feminino ou masculino Permite apenas a doação de gametas masculinos e proíbe a doação pelas mulheres, salvo no caso detalhado no item doação compartilhada de óvulos.
Doação compartilhada de óvulos A mulher de até 35 anos em processo de processo de reprodução assistida pode doar óvulos para uma mulher que nos os produz mais, em troca de custeio de parte do tratamento. A doadora tem preferência sobre o material biológico produzido. Regras foram mantidas
Reprodução assistida feita por homossexuais e solteiros Homossexuais e solteiros são citados na resolução como elegíveis para o tratamento. O uso da reprodução assistida passa a ser permitido legalmente. Além das garantias anteriores, foi clarificada a situação das homossexuais femininas, permitindo a gestação compartilhada em união homoafetiva feminina em que não exista infertilidade.
Descarte de embriões A clínica deverá manter os embriões congelados por 5 anos. Depois disso, podem descartar ou doar para estudos. A decisão sobre o destino dos embriões deve ser expressa por escrito pelos pacientes no momento da criopreservação. Manteve o prazo de 5 anos para o congelamento dos embriões antes do descarte e a necessidade de os pacientes expressarem por escrito o que deve ser feito depois desta data. Esclarece que a utilização dos embriões em pesquisas de células-tronco não é obrigatória.
Seleção genética para evitar doenças hereditárias Permite a seleção genética de embriões com o intuito de evitar que o bebê nasça com doenças hereditárias já apresentadas por algum filho do casal. Também passa a permitir o transplante de células-tronco desse bebê para o irmão mais velho. Veta a escolha do sexo do bebê em laboratório, com exceção dos casos de doenças ligadas ao sexo. Manteve os critérios anteriores. Esclarece que nos casos de seleções de embriões submetidos a diagnóstico de alterações genéticas causadoras de doenças, é possível a doação para pesquisa, ou o descarte.
Útero de substituição As doadoras temporárias do útero podem pertencer à família de um dos parceiros e ter até o grau de parentesco: mãe (1º grau), irmã (2º grau), tia (3º grau) ou prima (4º grau) Manteve as regras quanto ao grau de parentesco. Substituiu o termo “contrato” por “termo de compromisso” entre os pacientes e a doadora temporária do útero, esclarecendo a questão da filiação.
Fertilização post mortem Permite, desde que haja autorização prévia do falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado.




ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 54 DISTRITO FEDERAL RELATOR :MIN. MARCO AURÉLIO
REQTE.(S) :CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NA SAÚDE - CNTS
ADV.(A/S) :LUÍS ROBERTO BARROSO
INTDO.(A/S) :PRESIDENTE DA REPÚBLICA ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

ESTADO – LAICIDADE. O Brasil é uma república laica, surgindo
absolutamente neutro quanto às religiões. Considerações.
FETO ANENCÉFALO – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – MULHER – LIBERDADE SEXUAL E REPRODUTIVA – SAÚDE – DIGNIDADE – AUTODETERMINAÇÃO – DIREITOS FUNDAMENTAIS – CRIME – INEXISTÊNCIA. Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.

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No julgamento, os ministros decidiram que médicos que fazem a cirurgia e as gestantes que decidem interromper a gravidez não cometem qualquer espécie de crime. Com a decisão, para interromper a gravidez de feto anencéfalo, as mulheres não precisam de decisão judicial que as autorize. Basta o diagnóstico de anencefalia.

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio afirmou que “anencefalia e vida são termos antitéticos”. O ministro afirmou que existe, no caso, um conflito apenas aparente entre direitos fundamentais, já que não há qualquer possibilidade de o feto sem cérebro sobreviver fora do útero da mãe. O que estava em jogo, disse Marco Aurélio, é saber se a mulher que interrompe a gravidez de feto em caso de anencefalia tem de ser presa. Os ministros decidiram que não.

Conforme demonstrado, o feto anencéfalo não tem potencialidade de vida. Trata-se, na expressão adotada pelo Conselho Federal de Medicina e por abalizados especialistas, de um natimorto cerebral”, afirmou.

Na avaliação do ministro Celso de Mello, como a Lei de Doação de órgãos determina que o fim da vida se dá com a morte encefálica, um raciocínio semelhante pode ser adotado para determinar o começo da vida.

A atividade cerebral, referência legal para a constatação da existência da vida humana, pode, também, ‘a contrario sensu’, servir de marco definidor do início da vida, revelando-se critério objetivo para afastar a alegação de que a interrupção da gravidez de feto anencefálico transgrediria o postulado que assegura a inviolabilidade do direito à vida, eis que, nesses casos, sequer se iniciou o processo de formação do sistema nervoso central, pois inexistente, até esse momento, a figura da pessoa ou de um ser humano potencial.”

O decano do Supremo lembrou ainda que há várias teses científicas que discutem o início da vida, e que a Constituição não estabelece seu começo.
Teses sobre a vida
Tese
Marco inicial
Fundamentos Biológicos
Genética Fertilização — encontro do óvulo com o espermatozóide Com a fecundação, há a formação de estrutura celular com código genético único.
Embriológia 14º dia — completa-se a nidação (fixação do embrião na parede do útero) e a formação da linha primitiva (estrutura que dará origem à coluna vertebral) O embrião configura-se como estrutura propriamente individual: não pode se dividir em dois ou mais, nem se fundir com outro. Além disso, diferencia-se das estruturas celulares que formarão os anexos embrionários
Neurológica 8ª semana — aparecimento das primeiras estruturas que darão origem ao sistema nervoso central (SNC) / 20ª semana — completa a formação do SNC "per se" Baseada no mesmo argumento da morte cerebral: assim como a vida só termina com a parada dos sinais neurológicos, ela começa com o aparecimento das estruturas nervosas e/ou de seus sinais
Ecológica Entre a 20ª e a 24ª semanas — completa a formação dos pulmões, última estrutura vital a ficar pronta. Principal fundamentação da decisão da Suprema Corte norte-americana autorizando o aborto, refere-se à capacidade potencial do feto de sobreviver autonomamente fora do útero
Gradualista Não há Supõe a continuidade do processo biológico, no qual a vida é concebida como um ciclo. Neste sentido, a formação de um indivíduo começa com a dos gametas de seus pais ainda no útero das avós.

O ministro Gilmar Mendes votou pela descriminalização da prática, mas considerou, sim, que se trata de aborto. Para o ministro, o aborto de feto anencéfalo pode se encaixar nas hipóteses de exceção previstas no Código Penal em que o aborto não é considerado crime — em caso de risco à saúde da mãe e no de estupro.

O aborto de fetos anencéfalos está certamente compreendido entre as duas causas excludentes de ilicitude, já previstas no Código Penal, todavia, era inimaginável para o legislador de 1940. Com o avanço das técnicas de diagnóstico, tornou-se comum e relativamente simples descobrir a anencefalia fetal, de modo que a não inclusão na legislação penal dessa hipótese excludente de ilicitude pode ser considerada uma omissão legislativa não condizente com o espírito do próprio Código Penal e também não compatível com a Constituição”, afirmou Gilmar Mendes.

Os ministros Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso votaram contra a ação. Lewandowski argumentou que o tema é assunto para o Legislativo, não para o Supremo Tribunal Federal. Já o ministro Cezar Peluso considerou que não se pode admitir que o feto anencéfalo não tenha vida.

Nessa postura dogmática, ao feto, reduzido, no fim das contas, à condição de lixo ou de outra coisa imprestável e incômoda, não é dispensada, de nenhum ângulo, a menor consideração ética ou jurídica, nem reconhecido grau algum da dignidade jurídica e ética que lhe vem da incontestável ascendência e natureza humanas”, disse Peluso, que presidiu o julgamento.O ministro Dias Toffoli declarou-se impedido por ter trabalhado no parecer da Advocacia-Geral da União em favor da ação na época em que era o advogado-geral.(destacamos)