Tenho uma certa desconfiança de que a filosofia grega foi mais um
resultado da perda de sentido da religião pagã, em meio ao
desenvolvimento econômico e cultural do
mundo helênico, do que propriamente uma busca meramente intelectual, a
filosofia quando bem operada destina-se a ser uma ferramenta de busca de
sentido, mesmo que seja para negar o próprio sentido como fazia o
Nietzsche, em suma, o amor à sabedoria decorre de uma busca do sentido
inerente ao próprio saber.
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Liberdade não é uma realidade ontologicamente autônoma, é um direito
vinculado a muitos e variados condicionamentos prévios, por isso que sua
defesa implica em eterna vigilância
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A verdade é algo que possui uma essência própria, ou é somente o nome
que se dá para uma opinião predominante?
Um consenso coletivamente
partilhado é a fonte da verdade, ou uma
única pessoa pode ser o repositório de toda a verdade, não por ela
possuir à verdade, mas por ser possuída por esta?
Um conjunto de
interesses parciais e organizados pode estabelecer algum nível de
verdade, ou a verdade não está sujeita a nenhuma vontade?
Podemos
considerar que há uma postura mais ou menos conveniente em relação à
verdade, ou esta não admite se objeto da vontade alheia?
Afinal existe
alguma verdade que seja validada somente por conveniências políticas, de
grupos ou de pessoas, ou a verdade somente possui a conveniência de ser
verdadeira para toda a eternidade?
A verdade é um princípio da realidade, ou ela é criada pelas circunstâncias de cada momento?
Só sei que a verdade é verdadeira, porque afirmar que a verdade em
essência, ou em acidente, é uma mentira resulta numa petição de
princípio, numa aporia lógica, isto é, se for válida a negação da
existência da verdade, esta negação será verdadeira.
Como diria o poeta espanhol Antônio Machado (que conheci graças ao Olavo de Carvalho):
y sigue siendo verdad,
aunque se piense al revés"
"La verdad es lo que es
y sigue siendo verdad,
aunque se piense al revés"
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O AMOR A DEUS É O MODELO DO AMOR FRATERNAL
Uma anotação que deixo a respeito do Diálogo Fedro, é que o amor
definido por Sócrates, em seu mais alto nível, é o amor que se deve
guardar pela contemplação da verdade, do
bem, do justo e do belo no grau da pureza divina, e, que o eventual
amor carnal entre os amantes do saber, é uma forma de apequenar e
dessacralizar o amor ao saber, cuja origem é divinal, que deve ser
cultivado e resguardado entre amigos, em suma, o saber é muito mais
profundo quando associado à castidade, por ser um dever sagrado perante
Deus.
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A TEORIA MIMÉTICA E O FEDRO DE PLATÃO.
Sócrates discorre a respeito do mito, e de sua natureza questionável do ponto de vista racional, o que dá a entender que naquele
tempo histórico contemporâneo ao nosso filósofo, as verdades religiosas
tradicionais estavam sendo duramente criticadas, vejamos:
"IV - Sócrates - Se, a exemplo dos sábios, eu não acreditasse, não seria de estranhar. Interpretação sutil da lenda fora dizer que o ímpeto de Bóreas a derrubou dos rochedos próximos, quando ela brincava com Farmaceia, e que as próprias circunstâncias de sua morte deram azo a dizerem que Bóreas a havia raptado." (229d) (p. 36)
Ora, este
trecho revela-se perfeito, para análise com a utilização da chave
explicativa de René Girard, pois descreve um mito em que há um bode
expiatório (Oritia), e um deus (Bóreas) que personifica, neste caso, a
multidão, que em sua fúria lança a vítima do rochedo, sem contaminar-se
ritualmente com a violência bruta, pois utiliza-se de meios sagrados de
imolação, e, por outro lado, a própria explicação dos sábios referidos
por Sócrates, são um claro indício de um forte processo de
dessacralização da religião ateniense, submetida à crítica racionalista
que busca razões humanas para o surgimento das lendas.
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A MITOLOGIA DA ABSOLUTA AUTONOMIA DO EGO
Vivemos uma cultura fundada na mitologia da absoluta autonomia do ego,
que resulta na autodestruição egocêntrica, e, na minha opinião descalça e
nua, o remédio para esse mal está na
busca da verdade religiosa e filosófica, preferencialmente ambas, mas
cada uma destas buscas por si mesmas resultam nas únicas terapias
eficazes, pois são meios de mirar corretamente no alvo do
autoconhecimento que possibilita a autoconsciência, que por fim são os
instrumentos para refinar a percepção objetiva do mundo e de sua beleza e
bondade, com a reconquista da linguagem que possui a capacidade de
comunicar verdades da vida, pois hoje a juventude é um estrangeiro em
sua própria consciência.