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terça-feira, 20 de outubro de 2020

O direito é uma negociação


 

O direito é o nome que se dá ao fenômeno que surge da interação entre pessoas que negociam deveres entre si.

Justiça, por outro lado, é tanto uma proporção quanto um sentimento oriundo dessa negociação.
A justiça é uma proporção que avalia o equilíbrio entre as partes, tanto com base num regra de três direta como numa inversa.
Quando o equilíbrio é percebido desperta-se um sentimento catártico, que gera satisfação e segurança, todavia, quando percebe-se o desequilíbrio é como assistir uma peça estrelada por um canastrão ou um filme ruim, e, assim, a crítica pode ser literalmente destruidora.

A VERDADE SEQUESTRADA


Em tempos pós modernos e pós construtivistas, tempo em que a linguagem arbitrária de grupos tornam-se o sinônimo de uma verdade encomendada por vontades que se julgam soberanamente criadoras de uma nova ordem mundial, na qual é proibido fumar tabaco mas é desejável pitar uma nóia.

Em tempos na qual a programação mental é projetada para tornar a consciência humana anestesiada por um permanente clima de dissonância cognitiva por meio de infinitos estímulos contraditórios pavlovianos.
Em tempos que a Justiça foi transformada primeiro numa ideia, para depois a ideia ser criticada conforme os princípios bárbaros da pós-verdade, para assim ser possível afirmar-se que a verdade é aquilo que a voz portadora de autoridade afirme ser ou não ser.
Em tais tempos a tolerância passa a ser tolerar somente o que é permitido, o direito passa a ser o direito do mais forte, a justiça um simulacro da mentira, e a verdade uma ideia fora de moda que não está prevista na constituição nem no código civil, e, por isso mesmo, algo a ser checado quando uma pessoa qualquer expressa uma opinião.
A comissão da verdade que se consumou em tempo da presidenta, hoje se acerca na forma de comissões que avaliam a verdade de cada opinião nas redes, as inúmeras comissões das verdades que assolam o cidadão comum, checadores de fatos num mundo em que os mesmos checadores afirmam que não existe mais fatos consideráveis verdadeiros, ou pelo menos, que não sejam os fatos que lhes interessam ser considerados verdadeiros.
Nos tempos da pós-verdade a verdade é uma propriedade privada dos donos do poder.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

O MITO DO HERÓI E JAIR BOLSONARO



A página do STJ no facebook nunca foi tão "avaliada" em sua existência, como depois da confirmação da condenação do Deputado Federal Jair Bolsonaro ao pagamento de uma indenização civil àquela senhora defensora de menores infratores.

Jair Bolsonaro foi condenado a pagar a bagatela de 10 mil reais, e, em troca recebeu gratuitamente uma massiva campanha de "marketing involuntário", gerenciada por aquela "agência de propaganda" denominada STJ que destacou com tanta ênfase a notícia com a seguinte chamada: "Jair Bolsonaro terá de indenizar deputada Maria do Rosário por danos morais".

O Deputado Jair Bolsonaro é tão sortudo, mas tão sortudo, que até quando é condenado obtêm resultado prático melhor que o de uma absolvição, uma vez que uma condenação tão evidentemente injusta e contraditória tem mais forte repercussão social que uma óbvia decisão coerente com a realidade. A narrativa mitológica bolsonariana só se fortalece com tal condenação.

Por falar em narrativa mitológica, há uma distinção fundamental entre o mito na antiguidade e a compreensão sobre o mito após a boa nova cristã, que está justamente no reconhecimento da inocência fundamental do herói trágico, transformação operada pelo exemplo histórico presente na Paixão de Cristo.

O herói trágico, nas narrativas antigas, é a vítima sacrificial eleita pela fatalidade, que mesmo inocente de culpa e dolo aceita sua condenação, pois nem o herói é capaz de perceber-se fora da lei do eterno retorno mitológico da violência sagrada tão forte na cosmovisão pré-cristã.

O herói, após a instauração da percepção cristã da realidade, foi reconhecido como uma vítima da injustiça do sacrifício em nome da necessidade de se aplacar a violência social, o herói foi rebatizado de vítima inocente, mártir, e dependendo das circunstâncias pode ser reconhecido como um santo.

O brasileiro tem a clara percepção da injustiça inerente à condenação civil de Jair Bolsonaro, isso consolidará a sua narrativa heróica, pois nossa cultura é penetrada até a raiz pela percepção cristã da inocência da vítima injustamente sacrificada em nome dos poderes deste mundo.

Werner Nabiça Coêlho - 17.08.2017

sábado, 16 de abril de 2016

A REPUBLICA DE PLATÃO: O JUSTO E O INJUSTO PERFEITOS

Platão criou duas hipóteses interessantes sobre o ato de ser justo, uma que antecipou o advento de Cristo, outra que forneceu o argumento da obra "O Príncipe" de Maquiavel.

Estava Sócrates a discutir com Glauco acerca da encarnação da justiça perfeita e de seu contrário, e assim prossegue o diálogo, que transcrevo em diversas linhas separadas para realçar o valor poético do texto:

"Para podermos, agora, formar juízo sobre a vida desses dois tipos de que falamos, o justo e o injusto no grau mais elevado, será preciso isolá-los completamente

...imaginemos cada um deles como perfeito na sua maneira de viver.

Para começar, façamos do homem injusto um profissional completo em sua atividade.

Um hábil piloto ou um médico sabem distinguir perfeitamente o que é ou não possível nas respectivas profissões, empreendendo aquilo e abandonando o resto.

No caso de cometer algum engano são suficientemente hábeis para repará-lo.

Da mesma forma deverá proceder o homem injusto, que praticará com todas as regras da arte as suas malfeitorias, sem nunca se deixar colher em flagrante; caso queira, de fato, apresentar-se como mestre consumado de injustiça, sem de nada privá-lo...

...à prática dos piores crimes alie a mais elevada reputação de justiça; se chegar a dar algum passo em falso, seja capaz de corrigi-lo;

no caso de vir a ser conhecido algum dos seus atos, terá de dispor de dotes oratórios para justificar-se, além de poder decidir-se pela violência, sempre que esta se fizer necessária, ora com o emprego da coragem pessoal e da força, ora com os recursos materiais e a influência de amigos que tenha sabido angariar.

O justo como verdadeiro homem de bem, se for despojado de todas as honrarias e bens materiais com exceção da justiça, para que venha a formar perfeito contraste com o anteriormente concebido:

sem haver cometido a menor falta, passa a ser o tipo acabado do criminoso.

Posta, assim, à prova sua justiça, vejamos se se deixa abalar da má reputação e das suas consequências.

Mostra-se firme até à morte;

sendo justo, pareça injusto enquanto viver, para que, tendo ambos atingido a meta extrema,
um da justiça e o outro da injustiça,

seja possível decidirmos qual deles foi o mais feliz."
(360e-361b)


(Platão, A República, UFPA, p. 97-9)


Como bem se pode observar, com o dito por Sócrates, o homem justo, ao atingir a perfeição da justiça, será tratado como criminoso, sendo levado a enfrentar a morte e a solidão, será execrado em vida e considerado um pária.

O homem injusto, no ápice da maestria de sua arte do mal, terá todos os recursos possíveis em seu favor, terá reputação, amigos, dinheiro e poder, para agir como bem entender, e, assim, iludir a todos ao seu redor com uma boa reputação imerecida, fruto da própria injustiça.

Apesar de a descrição da vítima perfeita também ser aplicável ao próprio Sócrates, com mais razão ainda tal descrição do portador da justiça perfeita se aplica ao Cristo, o cordeiro de Deus, despojado e dotado de mansidão até o amargo fim.

Enquanto que o homem dotado da injustiça, no mais alto grau, é o paradigma daquilo que Maquiavel descreveu, um senhor deste mundo, um sacrificador que lava suas culpas com o sangue alheio e não mede esforços para triunfar sobre o próximo.
WERNER NABIÇA COÊLHO