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domingo, 5 de abril de 2020

A PANDEMIA QUE VITIMOU O BOM SENSO

Ésquilo (525/524 a. C.- 456 e 455 a.C)

Ésquilo, por volta de 400 anos a. C., já afirmava que na guerra,  a verdade é a primeira vítima, parafraseando-o, posso afirmar que nessa pandemia do vírus chinês, o bom senso foi a primeira vítima, uma vez que é óbvio que quarentena não é isolamento de toda a população, mas o isolamento de pessoas infectadas ou de pessoas do grupo de risco.

A religião positivista que erigiu a ciência como a medida de todas as cousas é tão estúpida que pressupõe uma permissão burocrática para liberar novos tratamento em plena emergência e calamidade.

Prefiro ficar com Aristóteles (Estagira, 384 a.C. – Atenas, 322 a.C.) que, por ser filho de médico, possuía senso comum suficiente para saber que a medicina é filha da arte e da experiência de cuidar paciente por paciente, com todas suas idiossincrasias.

O bom senso, se vigorasse ainda, deveria nos remeter à necessidade de sustentar a continuidade dos bens da vida, para que possamos ter recursos para tratar dos mais necessitados.

Para onde foi parar a experiência e a arte acumuladas pelos séculos dos séculos?

Aonde está a confiança na responsabilidade e no engenho humanos?

O medo da morte nublou o entendimento do Povo e seus governantes, e este mesmo medo está servindo de atalho para inúmeras formas de morrer, uma mais insidiosa que a outra, seja pela fome, seja pela violência, pela depressão e desespero, ou mesmo por meio de guerras.

Quem viver verá!

sexta-feira, 17 de junho de 2016

É BOM CITAR: O VOTO DE MINERVA



Um artista começa de repente do momento em que sabe dar razão a todos os seus heróis. 

Porque você não devolve a vida senão quando põe tudo em equilíbrio, quando dá razão a todos. 

São assim os heróis de Ésquilo: cada um com sua razão. 

Etéocles tem razão em defender a cidade de Tebas contra seu irmão, Polinice, que a assedia com um exército estrangeiro.

Mas Polinice tem razão em assediá-lá, porque Etéocles o afastou de sua parte na regência.

E o que é esplêndido é que também o coro se divide até o fim, nos Sete contra Tebas: metade segue Polinice, morto por ter razão; metade segue Etéocles, morto por ter razão.
 
***

Reencontro esse pensamento, mais belo, mais vivo, mais complexo, em Oréstia. 

Cada um tem razão de vingar-se.

As vinganças chamam umas às outras, entrelaçam-se, ramificam-se, acorrentam-se umas às outras.

Vingança contra vingança e vingança ao lado da vingança.

Egisto tem razão de querer a morte de Agamemno, porque este é da nação dos atridas, que lhe torturaram o pai, Tiestes.

Mas o assassino não é ele, Egisto, mas a própria esposa de Agamemno Clitemnestra, que tem razão de matar o marido, porque, porque este lhe sacrificara a filha, Ifigênia.

Mas quando Orestes, filho deles, vai matar Clitemnestra e Egisto, o amante dela, já não sabe bem por que vinga a morte do pai: a profanação que sua mãe fez do lar familiar, ou a perda de seu próprio cetro.

Já não sabe senão que tudo grita por vingança, pela voz, pelo gesto, pelo ser da irmã de Orestes, este monstro de piedade, amor e ódio: Electra.

Mas terminam aqui as vinganças? Não, porque até a sombra de Clitemnestra vai pedir vingança.

Mas as Fúrias, as Eumênides, instigadas por ela, perseguem Orestes, em nome da razão, porque matou a própria mãe.

"Agrada-nos termos razão", dizem as Fúrias.

Mas o lance não se fecha senão diante da sábia Minerva, que está para julgar entre as Fúrias e Orestes.

"É árdua a causa", diz Minerva.

E por isso vai instituir um tribunal de atenienses.

O resultado?

A despeito do testemunho de Apolo em favor de Orestes, a despeito do voto de Minerva em favor dele, é igual o número de votos.

O todo está em equilíbrio. Todo mundo tem razão.

Oh, como é "verdade"!

(Constantin Noica, Diário filosófico, p. 87-8)