Peter Kreeft na obra Buscar sentido no sofrimento distingue o Nirvana de Buda do Ágape de Cristo, este como exercício espiritual de amar o "eu" mediante o amor fraternal que me conecta ao meu próximo, enquanto que as Quatro Verdades Nobres regem um método com a finalidade de extinguir o sofrimento humano mediante a "eutanásia espiritual" do próprio "eu" pessoal, com a "redução do desejo a zero".
Afinal! O sofrimento é algo que devemos extinguir ou algo com a qual devemos conviver... troque a palavra "sofrimento" pelo pronome "eu" e faça seu próprio julgamento.
Segue a citação, que relata quando Buda decidiu investigar o porquê do sofrimento a seu próprio modo, no que foi seguido pelos seus primeiros cinco discípulos, e:
Peter Kreeft |
“... se sentou sob uma árvore, a árvore sagrada de Bo, ou Árvore da Iluminação, na postura de lótus, determinado a não se levantar até ter encontrado a solução para o enigma. Quando finalmente se ergueu, proclamou: “Eu sou o Buda”; e anunciou suas Quatro Verdades Nobres.
Essas Verdades compõem os fundamentos do budismo. Quando um discípulo pediu a Buda respostas para outras questões importantes, ele o advertiu de que apenas as Quatro Verdades Nobres são necessárias. Elas são:
1. A vida é sofrimento (dukkha: termo que designa um osso ou eixo fora de encaixe, quebrado, afastado de si mesmo). Nascemos em sofrimento, vivemos em sofrimento, morremos em sofrimento. Ter o que não se quer ter, e não ter o que se quer ter, isso é sofrimento.
2. A causa do sofrimento (e aqui Buda finalmente decifra seu enigma) é o desejo (tanha: ambição, vontade, egoísmo). O desejo gera distância entre ser e satisfação; essa separação é sofrimento.
3. A maneira de acabar com o sofrimento é eliminar o desejo. Tal estado é o Nirvana (extinção). Remova a causa, e estará removendo o efeito. O mundo tenta acabar com a distância entre desejo e satisfação pr meio do aumento da satisfação, e nunca obtém sucesso. Buda toma o caminho oposto: reduzir o desejo a zero.
4. A maneira de eliminar o desejo é o Nobre Caminho Óctuplo da redução do ego. A vida é dividida em oito aspectos, e em cada um deles o discípulo experimenta uma libertação, simplificação e purificação graduais. É um caminho que dever durar toda a vida; tudo o mais é posto a serviço da redução do desejo para se alcançar o Nirvana, a eliminação do sofrimento.
Eu não sou budista. Não consigo evitar encarar o Nirvana como uma eutanásia espiritual, matando o paciente (o ego, eu eu, o si mesmo) para curar a doença (egoísmo, egotismo). O budismo elimina o “eu” que odeia e faz sofrer, sim; mas esse é também o “eu” que ama. A compaixão (karuna) é uma das maiores virtudes budistas, mas não o amor (agape). Buda parece simplesmente não ter consciência da possibilidade de existência do amor fraternal, do desejo fraternal, da paixão fraternal, do ego fraternal.
Apesar de tudo, não posso deixar de respeitar a paixão pessoal de Buda de decifrar seu enigma, e da mesma forma admirar seu método – que implica nada mais, nada menos que a transformação da natureza humana. Ninguém mais além do próprio Jesus propôs um método tão radical. E Jesus também encarou de frente o real problema do sofrimento e propôs uma solução radicalmente diferente.
KREEFT,
Peter. Buscar sentido no sofrimento. Tradução de Alexandre
Patriarca. São Paulo: Edições Loyola, 1995, p. 13-4.
Nenhum comentário:
Postar um comentário